Colonizada apenas a partir da década de 1940, região oeste do Paraná reúne hoje 50 municípios.
Poucos territórios brasileiros tiveram um processo de ocupação tão peculiar quanto o oeste paranaense. Após deixar de ser região abandonada – a última a ser colonizada no Estado – e tornar-se grande absorvedora de imigrantes, rapidamente o território passou por um processo de expulsão. As causas de todos esses movimentos migratórios foram objeto de estudo do economista Ricardo Rippel, em pesquisa realizada na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Após analisar a situação atual da região em função de aspectos econômicos, políticos e sociais, dados demográficos e material histórico, entre outras fontes, o pesquisador conseguiu traçar um panorama que explica essas mudanças populacionais.
Considerado parte do território brasileiro apenas ao final da Guerra do Paraguai, em 1870, o oeste do Paraná acabou abandonado, principalmente devido à distância da capital – Cascavel, uma das maiores cidades, com quase 400 mil habitantes, por exemplo, fica a 500 quilômetros de Curitiba. O território foi então parar nas mãos de uma empresa da Inglaterra, a Companhia de Madeiras Del Alto Paraná, em decorrência das dívidas que o Brasil contraiu durante a guerra.
A companhia, que explorava madeira e erva-mate na região, abandonou o local em 1940 e devolveu a propriedade ao governo brasileiro. O baixo custo das porções de terra atraiu migrantes da Serra Gaúcha, que já estabeleciam atividades no oeste de Santa Catarina. As principais atividades econômicas foram a extração de madeira e a própria venda de terra, com o tempo substituídas pela agricultura e posteriormente pela indústria.
“Até 1950, a única cidade da região era Foz do Iguaçu, fundada em 1914 como base militar para proteção da fronteira”, diz Rippel. Até o final da década, mais quatro distritos se emancipariam: Cascavel, Toledo, Guaíra e Guaraniaçu. Estabelecidos os núcleos, várias cidades foram surgindo ao redor. Ao todo existem hoje 50 municípios na região.
‘Extremo sertão’
De acordo com censo realizado em 1940, a população do ‘extremo sertão do oeste paranaense’, como era chamada a região, era de apenas 7.645 pessoas. Em dez anos, as terras passaram a abrigar 16.421 habitantes e esse número saltou para 135.697 em 1960 – um aumento de 1775% em vinte anos. Trabalhadores de plantações de café que não encontravam mais inserção em estados do Sudeste e Nordeste também foram atraídos pela área rica em terra roxa.
O município de Toledo, que inicialmente tinha vocação agrícola, passa atualmente por um forte processo de industrialização (fotos: Prefeitura Municipal de Toledo).
No meio de tanta gente, foram parar na região muitos descendentes de italianos e alemães que, por tradição, criavam suínos. “Numa época em que ainda não havia geladeira, a gordura dos suínos era utilizada para conservar os alimentos e, por isso, muito procurada”, conta Rippel. A suinocultura, seguida pela avicultura, alavancou o desenvolvimento industrial das cidades. Hoje, o maior frigorífico de abate de suínos e um dos maiores de aves da América Latina encontra-se em Toledo.
Rippel explica que o desenvolvimento foi puxado pela população que, ajustando-se ao sistema produtivo, acabou alterando o critério de absorção de novos indivíduos. “No início, a grande leva de imigrantes tinha experiência na agricultura. Com o passar do tempo, a região passou a exigir maior qualificação e o fluxo diminuiu”, conta. “Logo depois vieram os instrumentos tecnológicos”.
Um indicador de desenvolvimento que pode ser utilizado em demografia é o número de tratores por área agrícola, que desocupa uma média de 16 a 19 trabalhadores. Em 1975, o número de tratores no oeste do Paraná era de 10.216, que passou a 31.986 em 1995, ano do último levantamento disponível. O cenário se modificou completamente: em 20 anos, a população da zona rural, que era de 80,19%, passou para 18,4%.
“Devido à interferência dos avanços tecnológicos, grande parte da população passou a buscar inserção no setor de serviços”, afirma o economista. A região, considerada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística um dos maiores pontos de absorção migratória até 1979, passou, a partir daí, a perder habitantes para municípios da região metropolitana de Curitiba e para estados como Mato Grosso do Sul e Rondônia.
“Outras porções territoriais do país passaram por processo semelhante, mas o caso do oeste paranaense é peculiar pelo curtíssimo espaço de tempo que levou para concretizar todas as fases desde a ocupação até a acomodação dos imigrantes”, diz Rippel. De grande pedaço de terra abandonado até pólo industrial, a região levou apenas duas décadas para se transformar.
Célio Yano
Especial para a CH On-line / PR
26/05/2006