Fumar compromete eficiência de quimioterapia

Que o fumo favorece o surgimento do câncer de pulmão não é novidade para ninguém. Agora, um estudo da Universidade do Sul da Flórida (EUA) mostra que, além de estimular o surgimento da doença, o tabagismo pode comprometer a eficácia das drogas usadas para combatê-las. A equipe de Srikumar Chellappan mostrou que a nicotina, componente causador da dependência nos cigarros, estimula a produção de proteínas que protegem as células tumorais da ação do tratamento quimioterápico.

A pesquisa, publicada em março no site da revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences , foi realizada com um tipo de células tumorais pulmonares que apresentam crescimento lento e acometem 80% dos pacientes com câncer de pulmão. Já foi verificado que esse tipo de câncer está associado fortemente ao tabagismo e que apresenta baixa resistência às drogas quimioterápicas.

Em testes feitos in vitro , a equipe cultivou células tumorais e avaliou a atividade dos quimioterápicos na presença e ausência da nicotina. As três drogas testadas (gemcitabina, cisplatina, e taxol) são de uso padrão para o tratamento do câncer de pulmão e induzem o suicídio das células tumorais num mecanismo chamado de apoptose.

Os pesquisadores verificaram que, quando colocadas em contato com a nicotina, as células tumorais passaram a produzir acima da média duas proteínas – XIAP e survivina – que as tornam mais resistentes à ação dos quimioterápicos. Quando a produção dessas proteínas foi bloqueada pelos cientistas, o efeito ‘protetor’ da nicotina foi anulado.

Nicotina e câncer
A nicotina não é a responsável direta pelo surgimento do câncer. Os produtos presentes na fumaça do tabaco provocam a formação do tumor, pois induzem a mutação de genes regulatórios vitais. “A nicotina não é considerada um desses agentes causadores de mutações, mas sua habilidade de impedir a morte celular pode contribuir para o crescimento e a progressão dos tumores já formados”, explica Srikumar Chellappan em entrevista à CH On-line .

Chellappan citou outros trabalhos que mostraram como a nicotina pode estimular o crescimento de tumores, como um estudo de 2001 que detectou a capacidade dessa substância de promover a angiogênese, ou seja, o desenvolvimento de novos vasos sangüíneos nos tumores.

A descoberta confirma os resultados de pesquisas de campo nas quais pacientes com câncer pulmonar que continuam fumando apresentaram resposta menos eficiente ao tratamento e maior índice de mortalidade. “Esses estudos são preliminares, mas muito sugestivos, e levantam a possibilidade de que a exposição à nicotina por qualquer meio pode afetar a terapia contra o câncer”, avalia Chelappan. “Mas ainda é preciso realizar estudos etiológicos dos pacientes que usam adesivos ou chicletes de nicotina e se submetem à quimioterapia, para obter um retrato completo.”

Marina Verjovsky
Especial para CH On-line
17/04/2006