Genoma da vaca

 


Dois grupos internacionais, que reúnem cientistas de 25 países, incluindo o Brasil, acabam de realizar o mais completo mapeamento e a análise do genoma da vaca, que poderão ser usados no melhoramento genético da criação de gado (foto: Michael MacNeil / USDA-ARS)

Acaba de ser divulgado o mais completo sequenciamento do genoma da vaca doméstica (Bos taurus), que revela pela primeira vez características genéticas que distinguem esse animal de humanos e outros mamíferos. O mapeamento e a análise do DNA bovino, feitos por dois consórcios internacionais de pesquisadores – com a participação de brasileiros –, fornecem dados sobre a evolução dos mamíferos e podem levar a melhorias na produção de carne e leite de vaca.

Um dos grupos de pesquisa realizou o sequenciamento do genoma bovino em alta definição. O outro se concentrou na análise da diversidade genética entre diferentes raças de vaca, o que possibilitou traçar a história da evolução do gado domesticado e de outros ruminantes a partir de um ancestral comum. O esforço reuniu mais de 300 cientistas de 25 países, incluindo o Brasil, e é descrito em dois artigos na revista Science desta semana.

O mapeamento dos 29 pares de cromossomos da vaca e do seu cromossomo X revelou pelo menos 22 mil genes codificadores de proteínas. Desse total, 14.345 genes estão presentes em sete outras espécies de mamíferos e 1.217 pertencem apenas a mamíferos placentários. Assim como roedores e cães, a vaca tem cerca de 100 genes não encontrados no genoma humano.

A análise mostrou que o processo evolutivo das vacas é surpreendentemente diferente do humano. O genoma da vaca parece ter se reorganizado significativamente desde que esses animais divergiram de outros mamíferos, enquanto o genoma humano é muito conservador se comparado ao do ancestral de todos os mamíferos placentários.

Segundo os pesquisadores, a vaca tem vários traços adaptativos que se refletem em sua biologia única, como seu sistema digestivo especializado. Os achados mostram que, ao longo da evolução e domesticação do gado, mudanças no número e na organização dos genes alteraram seus sistemas biológicos, afetando principalmente sua reprodução, imunidade, lactação e digestão.

Gado leiteiro e de corte
Os cientistas também investigaram 37.470 diferenças no DNA de 497 animais de 19 raças biologicamente diferentes e de locais variados. Eles descobriram que várias regiões do genoma eram diferentes em raças usadas para produção de leite e naquelas destinadas ao abate.

Os dados do mapa de diversidade genética bovina mostraram ainda que o gado sofreu recentemente uma rápida diminuição em seu tamanho populacional efetivo, em comparação com sua enorme população ancestral.

Essa queda seria resultado de um “gargalo genético”, associado a eventos passados de domesticação, seleção para especialização agrícola e formação de raças. Segundo os autores, a perda de diversidade relacionada a esse declínio é um problema para criadores de gado, já que a preservação da variação genética é essencial para manter a saúde dos animais e permitir a perpetuação dos mais aptos a enfrentar as mudanças climáticas e as doenças emergentes.

Os resultados do estudo podem ser usados no melhoramento genético da criação de gado, com o objetivo de aumentar a produção de leite, melhorar a qualidade da carne e selecionar animais resistentes a doenças. “Se conseguirmos entender a relação entre os genes e o produto final, então poderemos usar essa informação em nossos programas de melhoramento da carne”, diz em comunicado à imprensa um dos pesquisadores envolvidos no estudo, Jerry Taylor, da Universidade do Missouri (Estados Unidos).

Além de fornecer dados que permitem melhorar os produtos do leite e da carne bovinos e promover benefícios para o bem-estar dos animais, o estudo pode levar a um melhor entendimento de doenças humanas e seus tratamentos relacionados, já que o gado é amplamente usado como modelo para pesquisas na área de biologia reprodutiva humana e doenças infecciosas.


Thaís Fernandes
Ciência Hoje On-line
23/04/2009