Governantes desonestos, natureza ameaçada

Quanto maior a biodiversidade de um país, maior o índice de corrupção em seu governo. Essa é a conclusão de um grupo de cientistas ingleses, que enxerga nessa relação uma causa provável do fracasso de muitos projetos de preservação ambiental.

null

A extensão da cobertura florestal foi um dos parâmetros usados para se medir a biodiversidade dos países avaliados

Em artigo na Nature de 6 de novembro, pesquisadores das Universidades de Kent e Cambridge compararam o nível de corrupção do governo de 133 países com a sua biodiversidade, medida por três parâmetros: cobertura florestal, número de elefantes e número de rinocerontes negros (os dois últimos apenas em países africanos).

Esses dados foram cruzados com a nota de cada país na versão de 2003 do Índice de Percepção de Corrupção (CPI, na sigla em inglês) elaborado pela organização não-governamental Transparency International . Essa lista é baseada em entrevistas feitas com empresários e analistas de todo o mundo que dão notas de zero a dez para cada país.

Os resultados indicam que a variação das taxas de corrupção de países africanos teve influência bem maior sobre a população de elefantes e rinocerontes negros do que a mudança no nível de pobreza ou o aumento da densidade populacional. Além disso, o estudo concluiu que países com grande biodiversidade e áreas de prioridade máxima para conservação que receberam grandes doações de dinheiro para a preservação ambiental tendem a ter governos mais corruptos que outros países.

O Brasil se enquadra no perfil de país com fauna e flora ricas, mas também com alto índice de corrupção governamental. No último CPI, o Brasil ficou na 54 a posição com nota 3,9, atrás de países como Lituânia e Namíbia (quanto maior a nota, menor o índice de corrupção). Em relação à biodiversidade, o Brasil ficou em 17º lugar entre 83 países de uma lista elaborada pelos próprios pesquisadores em função do número de espécies de mamíferos e aves.

Os cientistas apontam a baixa remuneração de guardas florestais como uma das causas do desvio de recursos destinados à preservação ambiental. Porém, segundo o zoólogo Robert Smith, um dos autores do artigo, resolver essa questão específica não solucionaria definitivamente o problema da corrupção.

“Outras medidas a serem tomadas seriam a redução da burocracia e a melhoria de procedimentos contábeis para aprimorar a administração das doações, bem como o fim de leis que apenas reforçam a prática do suborno por serem difíceis de serem postas em prática”, disse ele à CH On-line .

Smith reitera ainda o papel da imprensa no monitoramento de projetos de conservação ambiental. “Jornalistas devem ser estimulados a investigar projetos e organizações de preservação do meio ambiente para descobrir se o dinheiro doado está sendo gasto da maneira correta”, disse.

Embora apontem essa relação direta entre biodiversidade e corrupção, os pesquisadores não sabem exatamente por que isso acontece. Eles apontam a necessidade de novos estudos para determinar a causa específica dessa relação.

Liza Albuquerque
Ciência Hoje On-line
05/11/03