Homens estressados, doenças à vista?

Uma recente pesquisa realizada no Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de São Paulo mostra que homens, ao lidarem com situações de estresse agudo, sofrem mais alterações no sistema imune do que as mulheres. Os resultados sugerem que essas mudanças podem estar relacionadas a variações hormonais – também observadas nos testes – e que a população masculina ficaria mais suscetível a doenças do que a feminina após períodos estressantes.

O estudo, desenvolvido pela psicóloga Alessandra Faustino em sua tese de doutorado, tinha como ponto de partida investigar os motivos que levam uma pessoa a adoecer ao passar por algum tipo de estresse. Para isso, dois grupos – um com 13 pessoas (sete mulheres e seis homens) com diagnóstico de fobia social e outro com 19 (sete mulheres e 12 homens) sem qualquer patologia psiquiátrica – foram submetidos a momentos de estresse e monitorados.

Os participantes tiveram que falar sobre diferentes situações estressantes em frente a uma câmera. Durante os testes, eles permaneciam com um cateter intravenoso para coleta de sangue e conectados a eletrodos, para que dados como pressão, temperatura e freqüência cardíaca fossem medidos.

Segundo Faustino, os testes eram realizados de modo que o estresse dos participantes fosse maximizado. “No início, o tom da minha voz e minha atitude eram mais amenos e amistosos, mas, durante o procedimento, adotava uma postura mais firme e seca”, relata.

As principais diferenças observadas entre os dois grupos estavam relacionadas ao aspecto psicológico. “Os pacientes com fobia social sentiam-se tão incomodados com a situação que deixavam de se concentrar na tarefa proposta e focavam-se nos próprios sintomas (coração acelerado e sudorese). Já os voluntários sem patologia, ainda que tivessem apresentado os mesmos sintomas, preocupavam-se com a tarefa de falar em público”, conta a pesquisadora.

Comparação surpreendente
A grande surpresa, no entanto, ocorreu na comparação entre os sexos. Os homens sofreram mais alterações em seu sistema imune do que as mulheres. A variação mais freqüente foi a diminuição no número de células responsáveis pela resposta imune específica (forma mais eficaz e mais demorada de combate a agressões sofridas pelo organismo) e aumento nos parâmetros responsáveis pela imunidade inata, primeira forma de autodefesa do corpo, mas menos eficiente.

Segundo Faustino, as mudanças no sistema imune estão relacionadas a alterações nos níveis dos hormônios ACTH (que controla a liberação do hormônio cortisol) e noradrenalina. O experimento afetou a porcentagem de células NK (responsáveis por combater vírus e células cancerosas) no sangue, o que está associado à liberação de adrenalina e noradrenalina – fortemente influenciada pelas reações emocionais dos participantes.

Os testes também interferiram nas taxas de cortisol, que tiveram um pico durante o período de estresse, independentemente do sexo ou dos grupos estudados. A maior liberação do hormônio, no entanto, ocorreu nos homens. “Mas o aumento verificado não ultrapassou os índices considerados normais, o que pode ser parcialmente explicado pelo fato dessas situações terem sido simuladas em laboratório”, ressalta. 
 

Níveis de ACTH no sangue ao longo do experimento. A maior liberação acontece nos homens e durante o discurso em frente à câmera de vídeo. Mesmo com as variações, os níveis hormonais dos grupos com fobia social (em vermelho) e sem patologia (em azul) permaneceram dentro dos limites normais da população brasileira.

A psicóloga explica que o ACTH e o cortisol atuam no direcionamento de recursos nutricionais e energéticos para os diversos sistemas do organismo e são fundamentais para que, em momentos de estresse, ele esteja pronto para reagir. Mas, quando o corpo é exposto a níveis de cortisol superiores ao normal por períodos prolongados, os efeitos tornam-se prejudiciais. Sua ação sobre o sistema imune é geralmente inibitória e provoca uma baixa na atividade imunológica, permitindo o surgimento de doenças.

Ainda há dúvidas sobre as maneiras pelas quais o organismo de cada sexo se adapta às alterações provocadas pelo estresse e como isso interfere na suscetibilidade a doenças. Segundo a pesquisadora, novos estudos, especialmente em situações reais, devem ser feitos para o melhor entendimento dos efeitos do estresse no organismo humano.

João Gabriel Rodrigues
Ciência Hoje On-line
17/04/2007