Identificado composto promissor para combater mal de Chagas

Foi identificada uma substância que promete combater o mal de Chagas de forma eficaz: o único tratamento que existe atualmente é muito tóxico e só é ativo na fase aguda da doença. O novo composto foi sintetizado a partir de um processo de alteração molecular do princípio ativo de um antimicrobiano (nitrofural) e pode no futuro dar origem a um remédio capaz de curar a doença. A substância foi sintetizada pela pesquisadora Chung Man Chin, da da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

O Trypanosoma cruzi é o agente causador da doença de Chagas (imagem: Laboratório de Bioquímica de Parasitas/ USP)

Usado em queimaduras, o nitrofural é um antimicrobiano muito eficaz para exterminar o parasita Trypanosoma cruzi , causador do mal de Chagas. No entanto, possui baixa solubilidade e exige, por isso, o consumo de grandes quantidades. Por ter uma elevada taxa de toxicidade, porém, não é bem tolerado pelo organismo humano e pode causar hemólise (quebra das células sanguíneas), doenças nervosas e muito desconforto.

A pesquisa de Chung Man Chin começou a ser desenvolvida na Universidade de São Paulo (USP), ao lado da professora Elizabeth Igne Ferreira. O objetivo inicial era produzir, a partir do nitrofural, um composto menos tóxico, que agisse apenas sobre o parasita. Com ele, seria possível desenvolver um tratamento para a fase crônica da doença, administrado por via oral. O nitrofural é utilizado somente como antimicrobiano tópico.

As tentativas de alteração molecular revelaram uma surpresa à equipe de pesquisadores. “Um dos compostos intermediários da reação química que pretendia transformar o nitrofural numa substância menos tóxica ao homem e com maior seletividade ao parasita mostrou-se especialmente interessante”, conta a pesquisadora. A substância em questão — o hidroximetilnitrofural — foi a que apresentou menor toxicidade em testes com células animais e tornou-se, assim, o alvo da pesquisa.

Testes in vitro confirmaram a seletividade da substância, que apresenta taxa de toxicidade maior para o parasita e menor para células animais. Atualmente, está sendo avaliada a toxicidade do composto em ratos e camundongos vivos, para que se descubra sua dose letal. Órgãos e tecidos desses animais também estão sendo examinados. Em seguida, deverão ser realizados testes em outros animais, como cães ou gatos e macacos. Como o ciclo crônico da doença não é bem reproduzido em culturas de células in vitro , o estudo da atividade da substância nessa fase também será realizado em animais.

A equipe de pesquisadores espera, agora, a conclusão dos testes em animais para iniciar o estudo da substância em humanos. No entanto, o processo é demorado e, mesmo nos países mais desenvolvidos, pode demorar de dez a doze anos. “No Brasil, há pouco investimento para a realização de testes pré-clínicos em animais. Contamos com a ajuda de apenas um órgão, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que financiou a pesquisa”, diz a cientista.

Apesar das dificuldades, porém, Chung Man Chin está bastante otimista e acredita na possibilidade de produzir, finalmente, um remédio capaz de tratar a doença mesmo em sua fase crônica: “O hidroximetilnitrofural é obtido a partir de um processo químico bem simples e barato, que permitiria a produção em larga escala do medicamento.”

Isabel Levy
Ciência Hoje On-line
25/08/04