Isolamento em baixa

Você ouve todos os barulhos do seu vizinho? Escuta passos vindos do corredor? Talvez seu prédio não seja construído conforme as normas internacionais de isolamento acústico – assim como a maioria das residências brasileiras. Desde 2003, esse problema tem chamado a atenção de pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina, onde existe um grupo que estuda a questão no Laboratório de Conforto Ambiental (Labcon-UFSC). A partir de um olhar histórico sobre a evolução da arquitetura no Brasil, iniciou-se um estudo para avaliar o nível de isolamento acústico nas residências brasileiras ao longo dos anos.

O casario colonial de Ouro Preto, com muitas edificações datadas do século 18, foi na maior parte construído com paredes de tijolos cujo isolamento acústico é maior do que o verificado em grande parte das casas brasileiras atuais.

A pesquisa sobre a acústica de edificações é muito recente no Brasil. A partir de
discussões iniciadas em sala de aula, a arquiteta e professora Elvira Barros Viveiros orientou um estudo sobre esse tema, realizado com a mestranda Elisabeth Duarte. O objetivo era avaliar o impacto das transformações que a arquitetura brasileira sofreu ao longo da história sobre o isolamento sonoro das edificações. Não foi feita uma medição técnica, apenas uma avaliação da forma e das características das edificações, como a espessura das paredes e a densidade do material utilizado. “A proposta era oferecer um panorama geral, uma visão abrangente do problema no Brasil”, explica Elisabeth.

O estudo avaliou construções desde o século 17 até os dias atuais em várias áreas do país e concluiu que houve uma queda de 35 decibéis (dB) no isolamento acústico, que é um parâmetro que permite medir a diferença no nível de pressão sonora nos dois lados da parede. Ao longo da história, o ruído saiu de níveis baixos para os altos patamares de hoje, ao mesmo tempo em que se diminuiu o isolamento. “Nas edificações do século 17 a19, o isolamento sonoro variava entre 73 e 60 dB”, conta Elvira. “Já do século 20 em diante, esse índice cai para entre 40 e 25 dB.”

Para melhorar e adequar a acústica nas edificações não são necessários recursos
especiais. Materiais já utilizados na construção civil dão conta do isolamento,
principalmente tijolos maciços e paredes espessas. Uma parede de tijolos dupla
pode isolar entre 50 e 65 dB, em função do afastamento entre as paredes e outros critérios. “Basta dar atenção a esse aspecto ainda na concepção do projeto para que não seja preciso tomar providências a posteriori, que têm alto custo e pouca eficiência”, aponta Elvira, que tem pós-graduação em acústica e trabalha há 21 anos na área. Entretanto, os responsáveis pelo procedimento nem sempre têm o conhecimento para tomar as atitudes necessárias.

Uma grande preocupação é a ausência de leis específicas que exijam um desempenho mínimo de isolamento nas edificações. Existem apenas normas que determinam os níveis de ruído máximo para cada ambiente, que funcionam como recomendações e raramente são cumpridas. Ao contrário do Brasil, em países da Europa e nos Estados Unidos existem normas específicas sobre isolamento acústico nas residências, com forte punição para aqueles que não as respeitam, além de pesquisas e trabalhos publicados sobre o assunto

No Labcon, a pesquisa sobre acústica terá continuidade em estudos que investigarão a acústica de edificações do século 21, marcado pela verticalização das cidades brasileiras a partir do final do século passado. Segundo Elvira, o apartamento residencial será o foco dos novos estudos. “Vamos estudar as transformações dos sistemas e processos construtivos e quantificar o impacto negativo que tiveram no grau de isolamento dos apartamentos”, conta. “Vamos avaliar as fachadas, lajes e paredes entre apartamentos, bem como estimar o aumento no ruído urbano. Do cruzamento dessas informações, traçaremos um diagnóstico do grau de conforto acústico que nossos apartamentos oferecem.” 

Rachel Dimetre
Especial para a CH On-line
28/07/05