O princípio de um brinquedo que fez parte da infância de muita gente pode dar origem a um método inovador para construir casas de forma mais rápida e barata e evitar desperdício. As peças de plástico de Lego foram a fonte de inspiração para a engenheira civil Sandra Regina da Silva, que desenvolveu em seu mestrado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) um tipo de tijolo com encaixes em sua superfície. O tijomad , como é chamado, tem ainda a vantagem de poder ser fabricado com o solo do próprio local da construção e é bastante resistente graças à tecnologia adotada e à serragem presente em sua composição.
Sandra Regina da Silva com um exemplar do tijomad, inspirado nas peças encaixáveis de Lego
(foto: Eber Faioli / Boletim UFMG)
O modo de usar o tijomad é muito simples: cada bloco apresenta encaixes verticais e horizontais que servem para prendê-los uns nos outros. A inovação dispensa a argamassa de assentamento geralmente usada para unir os tijolos, que é cara e gera muito desperdício. O reboco que reveste a parede também deixa de ser necessário, uma vez que a precisão do encaixe já deixa a parede lisa. “Como num lego, quanto mais peças são adicionadas, mais resistente fica a parede“, compara Edgar Mantilla, professor da UFMG que orientou o estudo ao lado da colega Judy Norka Rodo Mantilla. A técnica permite ainda diminuir sensivelmente o tempo de construção: duas pessoas conseguiram erguer uma casa de 40m 2 – inclusive o telhado – em apenas dois dias.
Outra inovação do tijolo é a presença de fibras vegetais na sua composição. Inspirado em pesquisas e estudos que indicam propriedades benéficas de fibras vegetais na construção, o tijomad é composto, além de solo e cimento, por um pouco de serragem de eucalipto. “O tijolo fica mais maleável, menos quebradiço”, explica Edgar. “A fibra age como uma armadura: se o tijomad cair no chão, tem menos chance de quebrar”. A quantidade dessas fibras, porém, é pequena e bastante precisa, cerca de 0,3 a 0,5 %, dependendo da composição do solo. “Mais do que isso prejudica o comportamento do tijolo”, esclarece Edgar.
Muro construído com tijolos encaixáveis desenvolvidos na UFMG
Ao contrário da maioria dos tijolos convencionais, feitos com argila, o produto desenvolvido na UFMG pode ser fabricado com terra. No entanto, antes de pegar a pá e começar a escavar seu quintal, saiba que é preciso submeter o solo a uma análise granulométrica (que mede a distribuição e o tamanho de seus grãos). “O tijomad elimina muito trabalho do canteiro de obras, mas intensifica a análise no laboratório“, afirma Edgar. A técnica do tijolo feito de solo e cimento, no entanto, não é uma novidade, já tendo sido utilizada até mesmo na construção das milenares muralhas da China.
A fabricação do tijomad requer ainda um outro cuidado: apesar de dispensar o cozimento usado nos tijolos tradicionais de argila, o processo demanda uma grande pressão e algum tempo de repouso para a hidratação do cimento através de uma cura úmida.
Ainda não se sabe quando a novidade estará disponível no mercado. Desenvolvido nos laboratórios da UFMG, o novo tijolo depende de uma parceria com a iniciativa privada para chegar aos consumidores. Alguns testes ainda precisam ser feitos para avaliar sua capacidade térmica e acústica em edificações. A idéia dos pesquisadores é que o tijolo atinja não só as classes mais baixas, pelo custo reduzido, mas também a classe média. “Pessoas já nos ligaram pedindo para utilizar o tijomad na construção de muros, casas e até de um hotel, em Congonhas”, revela Edgar.
Marcelo Garcia
Ciência Hoje On-line
30/08/05