Menos de três mil exemplares. É tudo o que resta do macaco muriqui na Mata Atlântica. Forte candidato a mascote das Olimpíadas de 2016, o primata corre o risco de sumir das florestas por conta do desmatamento desenfreado e da caça para consumo humano. No intuito de reverter esse quadro, pesquisadores traçam estratégias para garantir a sobrevivência do muriqui.
Batizado de Plano de Ação Nacional para a Conservação dos Muriquis (PAN Muriquis) e desenvolvido no âmbito do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o projeto conta com dez metas e 54 ações. As atividades são diversas e englobam medidas como a contagem das populações de muriquis, a fiscalização das florestas para protegê-los de caçadores e iniciativas de educação ambiental que conscientizem a população sobre a importância do macaco.
Na lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza, o muriqui-do-norte, que ocupa Minas Gerais e Espírito Santo, é classificado como animal criticamente em perigo e, dentro de três gerações, pode sofrer uma redução populacional de 80%. Já o muriqui-do-sul, encontrado no Rio de Janeiro, São Paulo e norte do Paraná, é classificado como espécie em perigo e pode ter sua população diminuída em pelo menos 20% dentro de duas gerações.
Até 2020, o PAN Muriquis pretende retroceder em pelo menos um nível o risco de extinção do primata. A meta é fazer com que o muriqui-do-norte seja classificado como espécie em perigo e o do sul como vulnerável.
Candidato a mascote
De origem indígena, a palavra muriqui significa povo manso da floresta e descreve um animal de comportamento pacífico e solidário. O hábito de abraçar seus companheiros fez do macaco um forte candidato a representar os anfitriões brasileiros nas Olimpíadas de 2016.
Veja vídeo da campanha em favor do muriqui como mascote das Olimpíadas de 2016
A campanha para eleger o primata-mascote do evento conta com o apoio de instituições envolvidas no PAN Muriquis e discute a necessidade de preservá-lo.
Para saber mais sobre ações que buscam garantir a sobrevivência do macaco muriqui, a CH On-line conversou com Maurício Talebi, bioantropólogo da Universidade Federal de São Paulo-Diadema e coautor do PAN Muriquis.
Como e quando começou a elaboração do PAN Muriquis?
O projeto surgiu a partir do Plano de Sobrevivência das Espécies, uma ferramenta conceitual da Comissão de Sobrevivência das Espécies (CSE), uma divisão da União Internacional para Conservação da Natureza. A CSE desenvolve atividades para a conservação de diversas espécies ameaçadas no planeta. O documento que descreve as ações do PAN Muriqui começou a ser desenvolvido em 2003 pelo ICMBio e foi finalizado em 2010. Esse planejamento contou com a participação de diversos setores da sociedade, como governo, universidades e organizações não governamentais.
Quais são as principais atividades do homem que prejudicam os muriquis?
Diversas ameaças acometem populações selvagens de muriquis. As principais são a redução de hábitat, caça ilegal, baixos investimentos em vigilância e fiscalização, índices reduzidos de reprodução em cativeiro e a fragmentação do hábitat em ilhas de florestas.
O senhor coordena o monitoramento das populações de muriquis em vários locais – alguns deles já são estudados há 20 anos. Como essa medida auxilia no planejamento de ações para preservar os muriquis?
Pesquisas de longa duração são fundamentais por vários motivos. É importante obter informações sobre os animais em várias épocas do ano, conhecer seu comportamento frente a variações ambientais, entender como eles organizam sua vida cotidiana e como executam tarefas vitais para a sobrevivência. Obtemos, também, informações sobre quais variáveis ambientais devem ser levadas em conta durante ações de reflorestamento do hábitat desses primatas. Complementarmente, esses estudos propiciam o treinamento das futuras gerações de pesquisadores. Nosso grupo de pesquisa na Associação Pró-muriqui treinou mais de 200 estudantes de graduação e pós-graduação nos últimos dez anos.
Quais são as principais dificuldades na execução do PAN Muriquis?
O principal fator restritivo é a baixa disponibilidade de recursos financeiros. Atualmente, contamos com recursos humanos qualificados para a execução desses trabalhos, mas faltam recursos para financiar a mão de obra. Uma das metas é criar um fundo financeiro que viabilize a execução de todas as ações do plano. Lamentamos que, no Brasil, os fundos financeiros para a conservação de hábitat e de espécies ainda sejam praticamente inexistentes.
O senhor acredita que a candidatura do muriqui a mascote das Olimpíadas de 2016 pode auxiliar na preservação do primata?
Certamente sim. A maioria dos brasileiros desconhece que o maior primata (não humano) das Américas ocorre exclusivamente em nosso país. Caso seja confirmado como mascote olímpico, o muriqui será conhecido globalmente e diversos setores da economia se interessarão por investir em um emblema tão poderoso quanto ele. Assim, será possível conseguir recursos para os esforços que poucos brasileiros e estudantes estão fazendo para a pesquisa e conservação da espécie. A conscientização nos níveis nacional e internacional poderá gerar recursos para continuarmos trabalhando e assim contribuirmos para que o muriqui possa ser visto ao vivo e a cores em seu hábitat natural pelas futuras gerações.
Este texto foi atualizado para incluir a seguinte alteração:
Além de Rio de Janeiro e São Paulo, o muriqui-do-sul é encontrado no norte do Paraná. (20/03/2013)