Regiões do Rio de Janeiro e de São Paulo que já sofrem com inundações, sobretudo na época de verão, devem ser ainda mais castigadas com a intensificação do aquecimento global. É o que revelam os resultados preliminares de um mapeamento feito nas duas metrópoles. Segundo o levantamento, que considera cenários climáticos futuros, as baixadas litorâneas do Rio de Janeiro e as marginais dos rios Tietê e Pinheiros na capital paulista serão as áreas mais afetadas. As mudanças climáticas, associadas à ocupação irregular do solo, podem agravar os efeitos de chuvas fortes e ventanias nessas localidades.
O levantamento faz parte de um projeto desenvolvido em parceria entre o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o Núcleo de Estudos de População da Universidade Estadual de Campinas (Nepo/Unicamp). A pesquisa pretende analisar as vulnerabilidades de grandes cidades aos efeitos do aquecimento global com base em dados já levantados por outras instituições de pesquisa, como o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) e, em âmbito regional, o Instituto Pereira Passos (IPP/RJ).
A escolha do Rio de Janeiro e de São Paulo para o mapeamento deve-se à semelhança entre as duas grandes metrópoles. De acordo com a arquiteta Andrea Ferraz Young, pesquisadora do Nepo, as duas capitais apresentam os mesmos problemas decorrentes da utilização indevida do solo. “São cidades grandes com um padrão de ocupação urbana sem critérios ecológicos e que desrespeita aspectos importantes como a topografia, por exemplo”, diz.
A ocorrência de alagamentos e quedas de encostas decorrentes das chuvas fortes já são, porém, fenômenos comuns nas duas regiões. “O problema é que, com as mudanças climáticas, os eventos extremos ficam mais frequentes e qualquer chuva pode levar a uma enchente”, completa Young.
Cenários climáticos
O mapeamento indica que, no Rio de Janeiro, os pontos mais críticos são a lagoa Rodrigo de Freitas, na Zona Sul da cidade, e as áreas próximas às baías de Guanabara e de Sepetiba, que abrangem também a Baixada Fluminense, na região metropolitana. Com as mudanças climáticas, a ocorrência de chuvas fortes e imprevisíveis deve se tornar mais frequente, o que deve aumentar a incidência de inundações nas áreas mapeadas.
As enchentes são agravadas ainda pelo tipo de ocupação urbana dessa metrópole, concentrada nas planícies litorâneas situadas entre o mar e a montanha. Além disso, áreas que normalmente não são alagadas também podem ser atingidas em um futuro próximo. A explicação para o prognóstico está na elevação do nível médio do mar, resultado do derretimento das calotas polares. “Naturalmente, o aumento do nível do mar ocorre aos poucos e por si só não causaria muitos impactos. Mas, quando associado à incidência de chuvas fortes, gera problemas”, alerta Young.
Diferentemente do Rio, a região metropolitana de São Paulo não é litorânea e, portanto, não sofre os efeitos do aumento do nível do mar. Porém, o cenário paulistano diante das mudanças climáticas não é mais favorável. A região, que já sofre com inundações, pode passar por um aumento no número de dias com chuvas fortes até o final deste século.
O levantamento do Inpe e da Unicamp aponta as regiões ocupadas nas marginais dos rios Tietê e Pinheiros, que cruzam a cidade, como as mais afetadas pelo aquecimento global. Essas são áreas de margens e várzeas que naturalmente contêm as águas das cheias. Entretanto, a ocupação da região por construções urbanas e pelo sistema viário compromete essa capacidade natural.
Young esclarece que o objetivo do projeto é oferecer dados que auxiliem a tomada de decisões públicas no combate ao aquecimento global. A pesquisadora lembra, no entanto, que no final de 2009 o governo estadual de São Paulo sancionou a Política Estadual de Mudanças Climáticas, que prevê meta de redução de emissão de gases poluentes como alternativa para amenizar os efeitos do aquecimento global.
No Rio de Janeiro, há uma proposta semelhante, a Política Municipal de Mudanças Climáticas Rio Sustentável, elaborada pela prefeitura. “O problema é que há sempre aquele famoso jeitinho brasileiro que leva a uma desconsideração das leis ambientais. É um processo demorado que depende da conscientização dos setores públicos e privados”, argumenta.
Júlia Faria
Ciência Hoje On-line