Mulheres na mira do HIV

 

Em todo o mundo, já há cerca de 40 milhões de pessoas infectadas com o vírus da imunodeficiência adquirida tipo 1 (HIV-1), sendo que aproximadamente 50% delas são do sexo feminino. O crescimento acelerado do número de casos de Aids entre as mulheres mereceu a análise dos cientistas Thomas C. Quinn e Julie Overbaugh, em um artigo de revisão publicado na revista Science de 10 de junho. 

Há 20 anos, quando foi descoberta, a Aids era uma doença que atingia principalmente homossexuais do sexo masculino. O padrão vem mudando, e a transmissão sexual heterossexual responde hoje por 80% dos casos de infecção pelo vírus, atingindo sobretudo as mulheres. Nos Estados Unidos, estima-se que anualmente o número de casos de incidência do HIV-1 cresce 15% entre as mulheres, enquanto entre os homens esse aumento é de apenas 1%. Dados do Ministério da Saúde mostram que, no Brasil, até 1996, a razão era de três homens infectados para cada mulher. A partir desse ano, essa diferença deixou de existir entre jovens de 15 a 19 anos. 

A mulher apresenta-se mais vulnerável ao HIV devido a fatores sociais e fisiológicos. A disseminação do vírus é maior na população mais pobre, por ter menos acesso à educação e saúde. Anticoncepcionais hormonais e doenças sexualmente transmissíveis alteram o epitélio vaginal, aumentando a suscetibilidade. Os primeiros ainda têm um papel mais ativo, uma vez que são voltados especificamente para a prevenção de gravidez indesejada. “As mulheres, ao terem como prioridade evitar a gravidez, podem deixar em segundo plano a prevenção do HIV”, destaca o médico Francisco Inácio Bastos, do Departamento de Informação em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz.

O artigo, que compila dados que há muito já vem sendo estudados, mostra que a epidemia ganha dimensões mais dramáticas na África Subsaariana. “As mulheres constituem 60% dos infectados pelo HIV-1 e 75% dos indivíduos infectados entre 15 e 24 anos”, informam os autores. Como em algumas regiões do continente, diz-se que ter relações sexuais com uma mulher virgem acaba com a infecção, isso faz crescer a cada dia o número de mulheres infectadas, que são cada vez mais jovens.

O número de mulheres portadoras do vírus já é quase três vezes maior do que o de homens na América do Norte e no leste, sul e sudeste asiático, chegando a quatro vezes na Oceania. Porém, a situação não é tão alarmante na Europa Central, no norte da África e Oriente Médio, onde o número de casos é praticamente igual nos dois sexos.

A América Latina encontra-se em posição intermediária, podendo ser comparada aos países do sul da Europa. Apenas um terço dos um milhão e meio de infectados são do sexo feminino. No Brasil, um fator relevante é a transmissão materno-infantil (ou transmissão vertical), que já atinge 2,7% do total geral dos casos notificados até agosto de 1999.

O artigo constata uma tendência mundial preocupante. É enorme o desafio imposto pela epidemia ao redor do planeta. Os pesquisadores destacam a necessidade de “tornar preservativos, tanto masculinos quanto femininos, acessíveis a todos. É preciso educar homens e mulheres sobre o HIV-1 e outras DSTs, inclusive estimulá-los a negociar sexo seguro e encorajá-los a buscar testes e tratamento”.

Rachel Dimetre
Especial para Ciência Hoje on-line
28/06/05