Mutações influenciam risco de esquizofrenia

 

Pacientes esquizofrênicos apresentam maior freqüência de mutação em algumas regiões específicas de seu genoma, segundo indicam os resultados de três pesquisas publicadas na semana passada nas revistas Nature e na Nature Genetics. Estudos anteriores já haviam apontado fatores genéticos por trás da esquizofrenia, mas nenhum havia sido feito na escala dessas pesquisas: no total, foram analisados os genomas de mais de 40 mil indivíduos em dez países, o que dá mais força às conclusões.

Dois dos estudos em questão, publicados na Nature, compararam o genoma de um grande número de pacientes esquizofrênicos com o de indivíduos saudáveis em busca de deleções ou de uma repetição anormal de grandes trechos do DNA – ou variações no número de cópias, como são conhecidas pelos especialistas (CNVs, na sigla em inglês). Um dos grupos – o Consórcio Internacional de Esquizofrenia – foi coordenado por Pamela Sklar, do Hospital Geral de Massachusetts (EUA), e o outro, por Kari Stefanson, da Universidade da Islândia.

Esses dois grupos chegaram a conclusões similares. Ambos estabeleceram uma relação entre risco para desenvolver esquizofrenia com deleções de grandes blocos do genoma (aproximadamente 100 mil pares de bases) de uma região do cromossomo 1 e de outra do cromossomo 15. “Essas descobertas consolidam o campo da genética psiquiátrica” avalia David St. Clair, co-autor dos dois trabalhos, em declaração à imprensa.

Já o terceiro estudo divulgado na semana passada, publicado na Nature Genetics, utilizou uma abordagem diferente, buscando por alterações pontuais no genoma – ou mutações de um único nucleotídeo (SNIPs, na sigla em inglês). O grupo de mais de 40 pesquisadores coordenados Michael Owen, da Universidade de Cardiff, no Reino Unido, buscou essas mutações no genoma de quase 20 mil participantes, esquizofrênicos ou não.

Genética x ambiente
As conclusões dos três estudos ajudam a entender a base genética da esquizofrenia, doença mental grave ainda sem cura caracterizada por delírio, alucinações, cognição alterada e comportamento desorganizado. Estudos anteriores já haviam apontado componentes genéticos envolvidos em seu desenvolvimento, mas a contribuição desses aspectos e dos fatores ambientais ainda não foi plenamente esclarecida.

A conclusão do trabalho coordenado por Kari Stefanson indica que ainda há um longo caminho a se trilhar até que se chegue a uma resposta definitiva para essa questão. “Embora as CNVs relatadas em nosso trabalho representem apenas uma pequena fração do risco genético de esquizofrenia, este é um passo excitante rumo ao que promete ser um campo frutífero para futuras investigações”, afirmam os autores.

Análise em larga escala
Os estudos divulgados na semana passada foram feitos com uma técnica que alia a tecnologia de miniaturização, desenvolvida a princípio para a microinformática, à tecnologia de manuseio do DNA. O uso de um microchip de DNA permitiu que centenas de milhares de seqüências genéticas fossem analisadas simultaneamente, realizando uma cobertura de mais de 95% do genoma humano. O uso do método reduziu muito o custo e o tempo de análise, possibilitando a realização do estudo em larga escala.

Os três estudos são fruto de colaborações internacionais que envolveram um grande número de pesquisadores. O trabalho coordenado por Kari Stefanson, por exemplo, é assinado por nada menos que 75 autores de 10 países, incluindo China, Estados Unidos, Islândia e outros países europeus. Esse estudo analisou o genoma de cerca de 1.500 esquizofrênicos e 33 mil não-esquizofrênicos, distribuídos por esses mesmos países. 

A análise em larga escala foi um importante trunfo desse estudo porque permite uma confirmação estatística dos resultados obtidos. “Somente realizando um estudo em larga escala pudemos conferir à nossa descoberta um alto grau de confiança”, declarou Edward Scolnick, membro do Consórcio Internacional de Esquizofrenia, em comunicado à imprensa.

A identificação dessas mutações pode trazer futuras aplicações tanto para o diagnóstico como para o tratamento da esquizofrenia. Mas é cedo para otimismo, segundo David St. Clair. “Embora este campo de pesquisa esteja progredindo rapidamente, muito trabalho ainda tem que ser realizado antes que essas descobertas tenham impacto na prática clínica”, alerta o pesquisador.

Vitor Lima
Especial para a CH On-line
05/08/2007