Nesse mar tem peixe

Mesmo com décadas de exploração e poluição, o potencial de pesca da Baía da Guanabara (RJ) é muito maior do que se imaginava. Um estudo revelou que a produção artesanal de pescado anual foi quase cinco vezes maior que a estimada pelo Ibama.

A garoupa é um dos peixes encontrados na Baía da Guanabara
(foto: reprodução/CH 183)

Em laudo técnico feito no ano 2000 após o acidente com o oleoduto da Petrobras, o Ibama estimou que a Baía da Guanabara produziria 1300 toneladas anuais de pescado. Porém, a equipe coordenada pelo biólogo Silvio Jablonski, do Departamento de Oceanografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), contabilizou uma produção artesanal de 6300 toneladas de pescado entre abril de 2001 e março de 2002.

Esse estudo pioneiro foi realizado por iniciativa da Fundação de Estudos do Mar (Femar), com recursos provenientes da multa paga pela Petrobras ao Ibama devido ao vazamento de óleo. Foram coletados dados sistemáticos sobre a pesca na baía para determinar o número de pescadores e embarcações em atividade, bem como a quantidade e valor do pescado. A pesca com fins industriais (sardinha boca-torta) já vinha sendo contabilizada à parte pelo Ibama, mas não difere da encontrada por Jablonski (12 mil toneladas).

“Já sabíamos que a estimativa do Ibama era muito pequena, mas a magnitude do erro nos espantou”, disse Jablonski. Essa disparidade se deve à forma como o Ibama e a equipe da Uerj monitoravam os pontos de desembarque de pescado na baía. Enquanto o Ibama se restringiu a apenas dois pontos, a pesquisa abrangeu 32. Os coletores de dados contratados para o estudo pertencem às próprias comunidades de cada região analisada, o que ajudou a reunir informações confiáveis sobre os locais onde a pesca artesanal predomina.

Os pesquisadores acreditam que a média anual de 70 mil toneladas de pescado — incluindo a pesca industrial — calculada para o estado do Rio de Janeiro também esteja subestimada. “O Pará pescou 100 mil toneladas no ano passado e alcançou a primeira posição do ranking nacional”, disse Jablonski. “Porém, a pesca não melhorou naquele estado, o que melhorou foi a coleta de dados.”

É possível que a estimativa de pesca para todo o Brasil esteja incorreta. “A produção anual do país gira em torno de 450 mil toneladas de acordo com o Ibama. Com maior esforço na coleta de dados, esse número saltaria para pelo menos 600 mil”, garante Jablonski.

O número de pescadores da Baía de Guanabara foi estimado em cerca de 3600, a partir da avaliação do número de barcos cadastrados no estudo e do tipo de pesca de cada um. O estudo não realizou o cadastramento direto para não contabilizar indivíduos que, mesmo sem viver exclusivamente da pesca, poderiam se declarar pescadores.

No entanto, esse dado foi questionado pela Federação dos Pescadores do Estado do Rio de Janeiro (Feperj), que sustenta que há mais de 10 mil pescadores na baía e pede uma indenização de 750 milhões de reais, em função dos prejuízos causados à pesca pelo acidente de janeiro de 2000. “Esse valor não reflete a realidade, pois equivale a cerca de 50 anos de produção de pescado de acordo com os valores médios encontrados pela pesquisa”, disse Jablonski.

Liza Albuquerque
Ciência Hoje On-line
05/09/03