Nova estratégia de combate à esquistossomose

Um estudo realizado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) pode abrir caminho para um tratamento mais eficiente e sem efeitos colaterais da esquistossomose. Os pesquisadores aplicaram uma técnica, chamada de interferência por RNA, para desativar um gene essencial do Schistosoma mansoni, verme causador da doença, e, dessa forma, diminuir seu poder de infestação. A técnica pode ser promissora também no combate a outras doenças.

A imagem de micrografia eletrônica mostra um par de Schistosoma mansoni, verme causador da esquistossomose (foto: Davies Laboratory / Uniformed Services University).

A esquistossomose, popularmente conhecida como barriga d’água, é uma doença crônica, típica de países tropicais e subtropicais onde não haja boa infra-estrutura de esgotos. No Brasil, a moléstia atinge em torno de 10 milhões de pessoas, ou cerca de 5% da população. Em seu estágio mais avançado, pode causar diarréia e problemas no fígado, rins e bexiga.

A equipe da Unicamp selecionou um gene fundamental para o metabolismo do verme causador da esquistossomose e identificou, dentro desse gene, uma seqüência de RNA mensageiro responsável pela transferência da informação genética.

Com o auxílio de um programa de computador desenvolvimento pelo próprio grupo, foi criada uma pequena molécula de RNA (molécula de interferência) que, ao ser injetada no hospedeiro, destrói esse pedaço do RNA mensageiro. Dessa forma, ela é capaz de ‘silenciar’ o gene, sem causar dano ao organismo do hospedeiro.

Durante os experimentos iniciais, realizados diretamente com o verme S. mansoni, os resultados apontaram uma redução de 60% na atividade do gene. Em testes com animais, foi observada uma diminuição de até 27% no número de vermes no organismo dos hospedeiros.

Alternativa promissora
Segundo a geneticista Iscia Lopes-Cendes, da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, ainda não é possível falar em cura para a esquistossomose. Mas a interferência por RNA se mostra uma alternativa de tratamento muito promissora.

Para a pesquisadora, que trabalha com a técnica desde 2002, a interferência por RNA apresenta diversas vantagens em relação à terapia tradicional para a esquistossomose, entre elas, a de não causar efeitos colaterais aos pacientes. “Durante os testes, não foi relatado qualquer efeito sobre o organismo dos animais. Além disso, essa técnica permite facilmente redesenhar a molécula no programa de computador, para ajustá-la à resistência e a mutações do parasita.”

Lopes-Cendes ressalta que a interferência por RNA, técnica que garantiu aos seus criadores, os pesquisadores norte-americanos Andrew Fire e Craig Mello, o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia de 2006, pode ser aplicada para tratar outras doenças. “Trata-se de um mecanismo que pode ser utilizado não apenas para combater doenças causadas por vermes, mas também por bactérias e vírus.”

A geneticista acredita que estudos com o RNA podem ser o primeiro passo para futuros tratamentos customizados de doenças. “Em algumas décadas, os médicos passarão a prescrever medicamentos voltados para as necessidades e características de cada paciente, e não mais de maneira genérica”, vislumbra.

Igor Waltz
Ciência Hoje On-line
18/03/2008