Novo olhar sobre a visão

Os resultados de uma pesquisa com neurônios localizados na retina, parte dos olhos que capta a luz, surpreenderam cientistas de instituições inglesas e norte-americanas. 

Experimentos com ratos mostraram que essas células, conhecidas até então apenas por seu papel em processos subconscientes, possuem a capacidade de transmitir informação visual ao cérebro. Portanto, desempenham importante papel na visão.

A função dessas células nervosas está relacionada à sua habilidade de produzir uma proteína sensível à luz conhecida como melanopsina. Apenas 1% dos neurônios localizados na retina é capaz de fazer isso.

No campo dos estudos sobre a visão, somente dois tipos de células fotossensíveis haviam sido identificados na retina de mamíferos: os cones e os bastonetes. Na presença de luz, essas células transmitem ao cérebro informações sobre forma, movimento e cor.

“Podemos desenvolver tratamentos nos quais a melanopsina contribua para a visão de pessoas com problemas na retina”

A descoberta de uma função visual em outras células da retina pode auxiliar em futuros tratamentos de determinados tipos de cegueira. “Podemos desenvolver tratamentos nos quais a melanopsina contribua ainda mais para a visão de pessoas com problemas na retina”, afirma Timothy Brown, neurocientista da Universidade de Manchester (Inglaterra) e autor principal do estudo publicado no periódico PLoS Biology, em entrevista à CH On-line.

O pesquisador adverte, no entanto, que a proteína pode fornecer, mesmo em ambientes bem iluminados, uma visão de baixa qualidade. “Talvez o suficiente para evitar grandes obstáculos, mas não para ler ou ver televisão”, diz Brown.

Estrutura da retina
A estrutura celular da retina. Estudo revela que os cones e bastonetes (à direita) não são as únicas células da retina a apresentarem função visual, como se acreditava. (imagem: Santiago Ramón y Cajal)

 

Nem tão cegos assim

Brown e seus colegas analisaram ratos sem cones e bastonetes nos olhos e observaram que, embora fossem tecnicamente cegos, os animais ainda apresentavam atividade elétrica no córtex visual do cérebro, quando expostos à luz.

“Utilizamos microeletrodos para monitorar mudanças provocadas por luzes de diferentes brilhos na atividade elétrica de áreas visuais do cérebro dos ratos”, explica o neurocientista. 

Quando o experimento foi feito em ratos sem melanopsina, os pesquisadores perceberam que o sistema visual dos animais era incapaz de distinguir entre a intensidade de luz correspondente a um dia nublado ou um a dia ensolarado.

Novo conhecimento pode ser usado para aperfeiçoar iluminação artificial

Além de auxiliar em novos tratamentos, a melhor compreensão da função dessas células nervosas poderia ser aplicada ao aperfeiçoamento da iluminação artificial, dos monitores de televisão e dos computadores. 

“A iluminação tradicional e os computadores são enxergados por meio da projeção realizada pelos cones e bastonetes”, explica Brown. “O uso de uma luz em torno da faixa de comprimento de onda média em que a melanopsina é mais sensível pode melhorar a experiência subjetiva de brilho”, completa.

Antes da descoberta, acreditava-se que o trabalho dos neurônios estudados se limitava ao envio de informações sobre a luz detectada no ambiente para o subconsciente.  Essas informações serviriam, por exemplo, para mensurar o brilho e regular o tamanho das pupilas e o relógio biológico para os ciclos diurnos e noturnos.

 

Bruna Ventura
Ciência Hoje On-line