Se você acredita que as mulheres são mais tagarelas que os homens, conforme prega o senso comum, é bom rever seus conceitos. Um estudo científico feito para investigar empiricamente essa questão concluiu que não há diferença estatística significativa entre os sexos quanto ao número de palavras faladas: homens e mulheres usam, em média, cerca de 16 mil palavras por dia.
Voluntária usando o gravador desenvolvido para o estudo. O dispositivo, preso no cinto do participante e com um microfone acoplado à lapela, grava 30 segundos de conversa a cada período de 12,5 minutos, enquanto o voluntário estiver acordado.
A conclusão foi tirada a partir de gravações de conversas cotidianas de 396 voluntários (210 mulheres e 186 homens). Durante vários dias, eles carregaram consigo um gravador desenvolvido para o estudo. O aparelho registrava 30 segundos de conversa a cada período de 12,5 minutos durante todo o dia, sem que os participantes soubessem quando ele estava ligado. Uma vez transcritas as conversas, as palavras foram contadas e o número total usado por dia foi extrapolado a partir desses dados.
Os resultados, publicados esta semana na revista Science , mostram que, entre os participantes do estudo, as mulheres falavam em média 16.215 palavras por dia; a média dos homens era de 15.669. Segundo a equipe do psicólogo Matthias Mehl, professor da Universidade do Arizona, a diferença entre os dois sexos, da ordem de 7% do total, não configura uma diferença estatisticamente significativa.
A média esconde, no entanto, diferenças individuais importantes entre os participantes do estudo. De acordo com Mehl, o homem mais prolixo monitorado na pesquisa usava cerca de 47 mil palavras por dia, enquanto o mais reservado falava pouco mais de 500.
A difusão do mito
A conclusão pode ajudar a derrubar um mito antigo e muito difundido na cultura ocidental. O estereótipo das mulheres tagarelas ganhou respaldo com a publicação recente do livro Como as mulheres pensam , da neuropsiquiatra Louann Brizendine, lançado no Brasil pela editora Campus. Na obra, a autora afirma, sem se basear em medições empíricas, que as mulheres falam em média 20 mil palavras por dia, em oposição às supostas 7 mil ditas pelos homens.
Esses dados circularam amplamente sem qualquer questionamento nos meios de comunicação e o mito ganhou força. No entanto, de acordo com a equipe de Matthias Mehl, nenhum estudo anterior havia feito gravações sistemáticas de situações normais de conversa de grandes grupos de pessoas durante um longo período.
Os autores reconhecem, no entanto, que as conclusões têm alcance limitado, devido à homogeneidade sócio-cultural dos participantes do estudo. Os voluntários eram todos estudantes universitários dos Estados Unidos e do México. O resultado talvez fosse diferente se fossem investigados indivíduos de outros setores sociais nesses países e em outras culturas.
De qualquer forma, a equipe acredita que as conclusões bastam para derrubar o mito das mulheres tagarelas. “O estudo pretendia testar a idéia de que as mulheres têm um cérebro diferente do dos homens, adaptado evolutivamente para falar mais”, disse Mehl à CH On-line . “Se fosse o caso, essas diferenças deveriam ser detectáveis tanto em um grupo de estudantes quanto em qualquer outra amostra.”
Entre os autores do estudo, há três homens e duas mulheres. Questionado pela reportagem sobre qual deles é o mais prolixo, o psicólogo brincou com o assédio que estava recebendo da imprensa na véspera da publicação do artigo: “Hoje, certamente o mais falante sou eu”.
Bernardo Esteves
Ciência Hoje On-line
05/07/2007