De volta, para o futuro

Completar 30 anos é um marco na vida de qualquer um. É hora de olhar para o passado de forma crítica, relembrar os sonhos realizados e procurar os motivos que fizeram alguns deles continuarem pendentes. Em especial, é hora de projetar o futuro, traçar novos planos e refrescar o espírito para manter-se jovem e capaz de encarar aventuras ainda mais ousadas nos próximos 30 anos. Foi justamente essa a tônica da cerimônia que deu início às comemorações do trigésimo aniversário do Instituto Ciência Hoje, realizada na quinta-feira (14/6) na Casa da Ciência, no Rio de Janeiro. 

A festa contou com a participação de um grande número de pesquisadores, jornalistas, funcionários, colaboradores e amigos de todas as épocas do ICH. Uma mesa-redonda juntou passado e presente para pensar o futuro do projeto: dois dos fundadores da revista Ciência Hoje, o físico Ennio Candotti e o neurocientista Roberto Lent (atual diretor do Conselho Deliberativo do ICH), se juntaram a Helena Nader, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), e Renato Lessa, diretor-presidente do instituto.

Mais do que milhares, milhões 

Na cerimônia, Ennio Candotti destacou a independência na trajetória da Ciência Hoje, que nunca se dobrou a interesses não científicos e sempre buscou cumprir seu papel social. O físico destacou as mudanças na vida política e econômica do país e a necessidade de novas transformações nas próximas décadas. “Com a melhoria das condições de vida, milhões de pessoas têm atingido um patamar de cidadania que não possuíam”, afirmou. “Temos que divulgar a ciência não para um público de milhares, mas para esses milhões, de forma a garantir que as conquistas da Ciência Hoje e da divulgação científica nas últimas décadas sejam, de fato, irreversíveis.” 

Exposição 30 anos
A exposição destaca episódios da história recente da ciência nacional e internacional, assim como a conjuntura política e econômica do Brasil, a partir das páginas da revista Ciência Hoje. (foto: Henrique Kugler)

Em seguida, Roberto Lent falou sobre as diferenças sociais, econômicas e científicas entre a época da fundação da Ciência Hoje e os dias atuais. Ele relembrou algumas das dificuldades enfrentadas nos primeiros tempos do projeto e deu destaque ao papel da própria CH nas mudanças do cenário nacional. “O Brasil avançou na pesquisa e na divulgação científica e é ótimo ter participado de um projeto que contribuiu com esse progresso, se consolidou, deu frutos e ajudou a sensibilizar os pesquisadores e a própria sociedade para a importância de divulgar e de aprender sobre a ciência”, reconheceu. 

Lent: “Não estamos satisfeitos ainda, é preciso levar a ciência à população de forma mais ampla”

Segundo Lent, no entanto, ainda há muito a ser feito. “O acesso à cultura ainda é pequeno e a escolaridade é baixa, assim como o poder aquisitivo de boa parte da população”, descreveu o neurocientista. “Não estamos satisfeitos ainda, é preciso buscar alternativas para levar a ciência à população de forma mais ampla, para atingir os milhões aos quais se referiu o Ennio.”

Sob o signo da política

Em um discurso emocionado, Helena Nader ressaltou o espírito sonhador da Ciência Hoje. “Essa revista foi criada por um grupo de meninos sonhadores, sobreviveu e se consolidou porque manteve sempre seus ideais e seu espírito”, disse. A presidente da SBPC também destacou os avanços na pesquisa brasileira nas últimas três décadas e voltou a reforçar que a ciência deve atingir um público cada vez maior. “Para isso, talvez fosse a hora de incluir a divulgação científica em projetos sociais nacionais, de forma a estimular a cidadania”, defendeu.  

Palestra abertura
Passado, presente e futuro na mesa que abriu as comemorações dos 30 anos do ICH: para superar os desafios das próximas décadas, ousadia dos fundadores jamais poderá ser deixada de lado. (foto: Thiago Camelo)

Último a discursar, o diretor-presidente do ICH, Renato Lessa, ressaltou a necessidade de investir na educação. “Nas últimas décadas, há um descompasso entre o acesso aos mecanismos da cidadania e a oferta de educação de qualidade, por isso, ainda sentimos, muitas vezes, que precisamos seguir inventando um público para a música que tocamos”, afirmou. “A Ciência Hoje nasceu e vive sob o signo da política, por isso é nosso papel contribuir nesse sentido, é preciso persistir na educação e na formação dos cidadãos brasileiros.” 

Lessa: “Tudo precisava ser inventado, na época, tudo era heroísmo e aventura. Hoje, a rotina é importante, mas o país ainda precisa de aventura”

Para o cientista político, o Programa Ciência Hoje de Apoio à Educação (PCHAE) aponta justamente nessa direção. “Através do PCHAE poderemos levar a ciência até esses milhões; é um projeto de sucesso, pioneiro e que pretendemos transformar em uma iniciativa nacional”, destacou. No final de maio, o programa recebeu o prêmio ODM Brasil.

Citando Gilberto Freyre, Lessa destacou a necessidade de nos mantermos, hoje, ousados e inventivos como aqueles que criaram a Ciência Hoje 30 anos atrás. “Tudo precisava ser inventado, na época, tudo era heroísmo e aventura”, explicou. “Hoje, a rotina é importante para consolidar o projeto da Ciência Hoje, mas o país ainda precisa de aventura. Nossa iniciativa será irreversível enquanto mantivermos nossos ideais próximos aos que guiaram nossos fundadores”, concluiu. 

Após a cerimônia, foi inaugurada oficialmente a exposição ‘Ciência Hoje 30 anos’ e lançado o livro Química Hoje. A mostra fica em cartaz na Casa da Ciência até o dia 8 de julho. As comemorações do aniversário do ICH continuam, com palestras e oficinas. Confira a programação completa.

 
Marcelo Garcia
Ciência Hoje On-line