Dois novos trabalhos devem ajudar a entender a diferença biológica entre homens e mulheres, fruto da informação genética contida nos cromossomos sexuais X e Y. Os estudos – ambos publicados na edição de 17 de março da revista Nature – elucidam características do cromossomo X. As mulheres possuem duas cópias dele e, por isso, uma é inativada para evitar a superprodução de algumas proteínas. Já os homens têm um X e um Y.
Capa da Nature de 17 de março, que traz dois artigos sobre o cromossomo X (imagem: reprodução)
No primeiro trabalho, Mark T. Ross, do Instituto Sanger, em Cambridge (Inglaterra), e mais de 250 pesquisadores de diversas instituições seqüenciaram 99,3% do cromossomo X. Já Laura Carrel, da Universidade Penn State, e Huntington Willard, da Universidade Duke, ambas nos Estados Unidos, descobriram que cerca de 15% dos genes localizados na cópia inativada do X escapam dessa inativação.
Pela hipótese atualmente aceita, o X e o Y, comuns a todos os mamíferos, surgiram de um par de cromossomos não ligados à sexualidade (autossomos) cerca de 300 milhões de anos atrás. Mutações sucessivas fizeram com que os dois se diferenciassem e o Y se tornasse o fator determinante da masculinidade, perdendo a maior parte dos genes que não estivessem relacionados a essa função. Essa informação genética não desapareceu e foi mantida no X.
O seqüenciamento do cromossomo X revelou a existência de 1.098 genes, cerca de 4% do número total do genoma humano. Essa densidade genética (número de genes por número de bases) é uma das menores encontradas até hoje. Segundo os pesquisadores, isso pode indicar que o autossomo ancestral também tinha uma baixa densidade, ou então que os genes que codificavam proteínas necessárias em dose dupla foram transferidos para outros cromossomos.
O trabalho também descobriu que 10% dos genes do cromossomo X expressam proteínas comuns nos tecidos do testículo e cuja atividade aumenta em cânceres nessa região. Essas substâncias são usadas pelo sistema imune para identificar tumores e podem ser possíveis fontes de vacina contra essas doenças. Ross e seus colegas constataram ainda que um terço da seqüência do cromossomo é composto por elementos repetitivos de DNA, que parecem servir como um reforço do sinal de inativação do cromossomo nas células humanas.
O trabalho de Carrel e Willard parece confirmar essa informação. Os dois pesquisadores compararam a expressão de 624 genes nos cromossomos X ativo e inativo de uma mesma célula. Os resultados indicaram que 15% deles escapam da inativação, a maioria dos quais está concentrada em uma região do braço pequeno do cromossomo, que apresenta poucas seqüências repetitivas. Além disso, outros 10% dos genes parecem ter um perfil de ativação variável: estão ativos apenas em algumas amostras.
“Como alguns desses genes estão envolvidos em doenças, é possível que haja repercussões para o aconselhamento genético de mulheres”, explica Carrel em entrevista à CH On-line . Para Maria Rita Passos Bueno, do Instituto de Biologia da Universidade de São Paulo, o estudo é de extrema relevância. “O processo de inativação do cromossomo X em humanos (e mesmo em mamíferos) ainda é muito pouco compreendido. Esse trabalho poderá possibilitar a caracterização de novas regiões relacionadas ao controle desse fenômeno”, avalia.
Fred Furtado
Especial para a CH On-line
16/03/05