Os orangotangos ( Pongo pygmaeus ), assim como os humanos e os chimpanzés, possuem cultura. Essa foi a conclusão de um grupo internacional de pesquisadores após analisar milhares de horas de filmes feitos ao longo de 30 anos em 6 localidades das ilhas de Sumatra e Bornéu, na Indonésia. Segundo o bioantropólogo holandês Carol van Schaik, coordenador do grupo, eles identificaram 24 comportamentos possivelmente culturais. Os resultados foram publicados na edição de 3 de janeiro da revista Science .
Orangotango usa graveto para alcançar sementes de fruta do gênero Neesia (imagem: Perry van Duijnhoven)
A idéia para o estudo veio da constatação de que os orangotangos usavam ferramentas: alguns grupos usam um graveto para chegar às sementes de uma fruta espinhosa do gênero Neesia . Em contraste, outros grupos, que vivem em hábitats aparentemente iguais, não apresentam esse comportamento. “Depois de nos convencermos de que esse comportamento era cultural, queríamos saber se havia mais deles”, conta Van Schaik à CH on-line .
Partindo da definição de cultura como um sistema de comportamentos transmitidos socialmente, o grupo estudou os filmes à procura de variações geográficas de comportamentos. Uma variante era considerada cultural quando era apresentada pela maioria de indivíduos de uma localidade, mas era inexistente em outra. Entre os 24 comportamentos apontados como possivelmente culturais estão o uso de um graveto para coçar partes do corpo, o uso de guardanapos de folha para limpar látex do rosto e a ‘brincadeira’ que consiste em tentar se equilibrar sobre troncos mortos empurrados ao chão pelos primatas.
Antes dos orangotangos, traços culturais já haviam sido identificados
em chimpanzés e seres humanos (foto: Carol van Schaik)
A descoberta antecipa o surgimento evolucionário da cultura de sete para 14 milhões de anos atrás, quando os orangotangos divergiram dos outros primatas, e levanta a possibilidade das outras duas espécies de grandes macacos — gorilas e bonobos — também possuírem cultura. “Acredito que comparações mostrariam isso, mas não há dados suficientes para fazê-las” lamenta o bioantropólogo.
O grupo pretende agora conduzir um estudo mais detalhado dos indivíduos e comportamentos e compará-los tanto no interior de uma localidade quanto entre várias delas. A tarefa pode ser mais difícil do que os pesquisadores pensam, já que o desmatamento ilegal está destruindo as áreas estudadas, como Suaq Balimbing (Sumatra), que está quase desaparecendo.
Fred Furtado
Ciência Hoje on-line
06/02/03