Um estudo revelou que os papagaios, da mesma forma que humanos, utilizam a língua para modular sua fala. Pesquisadores das Universidades de Indiana (EUA) e de Leiden (Holanda) asseguram que, apesar de homem e papagaio usarem órgãos característicos diferentes para produzir vibrações e fazer barulho, em ambos, o controle motor dos movimentos da língua desempenha uma função importante na comunicação.
“Obtivemos a primeira evidência direta que papagaios são capazes de usar suas longas línguas para mudar propriedades acústicas de suas vocalizações”, afirma o neurologista Roderick Suthers, um dos autores do estudo publicado em setembro na revista Current Biology .
Acreditava-se que toda a complexidade comunicativa dessas aves originava-se em um órgão chamado siringe, uma caixa de voz localizada entre a traquéia e os pulmões, com função semelhante à laringe humana, onde ficam as cordas vocais. No entanto, os papagaios movem suas línguas para frente e para trás enquanto vocalizam, como já devem ter notado ornitólogos e admiradores de pássaros.
Para o estudo, os pesquisadores selecionaram cinco aves da espécie Myiopsitta monachus , nativos da América do Sul. Os animais foram capturados na Flórida, onde invadem pomares e competem com outras espécies locais por abrigo.
Os pesquisadores tiveram a autorização da Sociedade Americana de Veterinária para sacrificar cada ave. Eles implantaram um pequeno alto-falante eletrônico no lugar da siringe em cada um dos cinco espécimes. Enquanto uma série de sons passava através dos aparelhos, os pesquisadores manipulavam a língua dos animais e gravavam as mudanças de tom produzidas.
A equipe constatou que apenas uma fração de milímetro mudada na posição da língua pode afetar significativamente a qualidade do som emitido. “Por analogia, a mudança é maior do que a diferença entre um A e um O no discurso humano”, enfatiza Gabriël Beckers, autor principal do estudo.
Os pesquisadores também afirmam ter identificado quatro formantes acústicos nos sons produzidos pelos periquitos. Formantes são pequenos intervalos de freqüências que permanecem fortemente audíveis após o som ter passado pela garganta, língua, boca e cavidades nasais (a geometria desses órgãos enfraquece a maior parte das freqüências). Esses formantes produziriam distinções nas características do som, ou seja, a voz da ave.
No caso de humanos, diferenças genéticas, crescimento e comportamento fazem com que os formantes sejam como impressões digitais que variam de um indivíduo para outro. Os pesquisadores mostraram que papagaios também teriam essas diferenciações.
A equipe agora pretende analisar como essas mudanças ocorrem nas estruturas responsáveis pela variação em humanos e papagaios. “O som dessas aves é um modelo excelente para estudo do discurso humano e para a compreensão do desenvolvimento do comportamento na comunicação”, destaca Beckers.
Renata Moehlecke
Ciência Hoje On-line
27/09/04