Pato-mergulhão: termômetro ambiental

O pato-mergulhão, ave criticamente ameaçada de extinção, tem mais a ver com a preservação da água do que se imagina. É o que mostra um recém-lançado documentário da Universidade Federal Fluminense (UFF) sobre os hábitos da espécie, que funciona como um termômetro para medir a conservação do ambiente em que vive. Filmado no Parque Nacional da Serra da Canastra, em Minas Gerais, o DVD também traz as únicas imagens do mundo da rotina do pato-mergulhão em seu ninho.

Atualmente, o pato-mergulhão (Mergus octosetaceus) só pode ser encontrado no Brasil. A espécie não tem sido vista em outros países da América do Sul onde era encontrada anteriormente. A maior concentração dessa ave já documentada localiza-se próximo à nascente do rio São Francisco, na Serra da Canastra. A ave encontra refúgio nas águas cristalinas e repletas de corredeiras e piscinas naturais do “Velho Chico”. Essas características ambientais definem o hábitat preferencial do pato-mergulhão.

O problema é que, com a maior urbanização à beira do São Francisco – um dos rios mais importantes do país –, cada vez mais detritos têm sido lançados nas suas águas, que banham 503 municípios brasileiros. O aumento da poluição no rio ameaça a sobrevivência dos patos-mergulhões.

“Quando a água sofre os efeitos das diferentes formas de poluição e torna-se turva, a ave, que normalmente mergulha à caça de peixes, tem dificuldade de sobreviver nesse ambiente alterado e deixa de habitar o local”, diz o veterinário Sávio Bruno, da UFF, responsável pelo projeto que deu origem ao DVD Biologia e conservação do pato-mergulhão no Parque Nacional da Serra da Canastra e entorno. Ele destaca: “O pato-mergulhão pode ser bandeira de conservação do rio São Francisco.”

O pesquisador ressalta que muito conhecimento sobre a biologia da espécie tem sido obtido nos últimos anos. “Essas informações são essenciais para que sejam aprimoradas as estratégias de conservação da ave e para despertar a consciência ecológica da população frente ao complexo e delicado equilíbrio dos ecossistemas brasileiros, especialmente o cerrado e a mata atlântica.”

Imagens inéditas

Clique na imagem para ver trechos do documentário Biologia e conservação do pato-mergulhão que mostram o comportamento reprodutivo da espécie.

O veterinário e seus alunos conseguiram captar imagens inéditas do comportamento do pato-mergulhão no ninho: desde a preparação do local até a proteção dos ovos e o nascimento dos filhotes. Durante as quatro expedições feitas entre 2006 e 2007 para a realização do documentário, a equipe de Bruno acompanhou dois ninhos. Até então, pesquisadores haviam encontrado apenas dois ninhos da espécie – um na Argentina, há mais de 60 anos, e outro no próprio Parque Nacional da Serra da Canastra, em 2001.

No entanto, atingir esse resultado não foi fácil. O pato-mergulhão é uma espécie arisca e difícil de ser encontrada. Ao menor sinal da presença de predadores, a ave bate em retirada. Bruno conta que a equipe devia estar a postos antes mesmo de o sol nascer, além de camuflar roupas e câmeras. “Tínhamos que chegar antes das primeiras luzes da manhã, para que o pato não percebesse nossa presença”, lembra. “A captação de imagens exige silêncio absoluto”, completa. 

Comportamento registrado
O pato-mergulhão é monogâmico. Os casais, uma vez formados, vivem juntos anos a fio. Além disso, a ave é extremamente territorial: só divide o trecho de rio no qual vive – cuja extensão varia entre cinco e dez quilômetros – com o(a) próprio(a) parceiro(a). Os filhotes, quando já estão independentes, deixam a área dos pais e procuram o próprio canto.

Lambaris e pequenos invertebrados são os principais alimentos dessa ave. A ciência ainda não sabe responder qual é o tempo de vida médio do mergulhão; porém, sabe-se que ele é longevo.

O trabalho de Bruno não para por aí. Ele pretende continuar a estudar o pato-mergulhão. “As pesquisas avançam a cada ano”, comenta. “A proteção do pato-mergulhão representa a preservação das águas e, portanto, de todos os organismos vivos.”  

   Biologia e conservação do pato-mergulhão no Parque Nacional da Serra da Canastra e entorno, Minas Gerais, Brasil
Duração: 51min 58s
Ano: 2009
Editado com o apoio da Universidade Federal Fluminense e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro.
Interessados em adquirir uma cópia devem entrar em contato com Sávio Freire Bruno, pelo endereço eletrônico [email protected] ou pelo telefone (21) 2629-9530.


Raquel Oliveira
Ciência Hoje On-line
21/07/2009