Perfis contam 2500 anos de história da medicina

Embora a medicina seja vista com credibilidade no mundo ocidental, essa imagem levou séculos para ser construída. Antes de ela se vincular à ciência e tecnologia, a fronteira que separava médicos e cirurgiões dos curandeiros e charlatões era tênue. É impossível compreender a medicina contemporânea sem percorrer 2500 anos de descobertas sobre o corpo humano, gênese de remédios, tratamentos e terapias engenhosas que muitas vezes se confundiam com misticismo.

Reconstituir essa história pela trajetória de seus principais personagens foi a tarefa do americano John Galbraith Simmons no livro Médicos e descobridores – vidas que criaram a medicina de hoje . A obra traça o perfil de 86 indivíduos que realizaram algumas das principais contribuições para o estabelecimento da medicina ocidental. Essa história remonta à Antiguidade clássica: o mais antigo personagem descrito é o grego Hipócrates, que viveu no século 6 a.C.

Os perfilados — que não são necessariamente médicos ou pesquisadores da área — são divididos em seis eixos temáticos. No primeiro, Simmons descreve pensadores que ditaram os rumos que a medicina ocidental iria seguir — como Charles Darwin (1809-1882), que formulou a teoria da evolução e da seleção natural, e Louis Pasteur (1822-1895), que estabeleceu a causalidade entre a ação de microrganismos e a ocorrência de certas doenças.

O segundo bloco reúne os responsáveis pelas maiores transformações do pensamento médico, como Paracelso (1493-1541), que elaborou a noção de que doenças têm causas externas. Em seguida, o autor aborda referências inevitáveis na história da medicina, como Sigmund Freud (1856-1939), considerado pai da psicanálise, até chegar, no bloco seguinte, a figuras que deram base à medicina moderna, como Hans Krebs (1900-1981), que reconheceu que o metabolismo ocorre dentro das células e é governado por enzimas.

Na quinta parte, ele traz o foco para o presente, com figuras como Bert Volgelstein (1949-), que desenvolveu uma explicação genética do câncer. Fecha a obra uma “miscelânea” que inclui nomes como o do persa Avicena (o ‘príncipe dos médicos’ — 980-1037). Além da história dos perfilados, o autor relata também a invenção de instrumentos e técnicas, do estetoscópio aos exames de ressonância magnética.

Em tom didático, os perfis oferecem o contexto histórico para a compreensão da importância de cada personagem. E são repletos de curiosidades sobre a vida e personalidade de cada pensador. Simmons conta, por exemplo, que Elie Metchnikoff (1845-1916), que descobriu os glóbulos brancos no sangue, esperava viver até os130 anos e que, para isso, consumia uma grande quantidade de iogurte. Já Robert Koch (1843-1910), que desenvolveu novas técnicas em microscopia, durante um período de sua vida, comia 500 gramas de manteiga por dia e tentava medir o nível de ácidos em sua urina.

A leitura de Médicos e descobridores é leve e agradável. O leitor não precisa, necessariamente, seguir a ordem apresentada dos personagens. Os perfis não chegam a 10 páginas e podem ser consultados independentemente sem comprometer a unidade do livro. Cada leitor tem assim a possibilidade de constituir seu próprio percurso nessa fragmentada história.

 

Médicos e descobridores –
vidas que criaram a medicina de hoje

John Galbraith Simmons (Trad.: Ryta Vinagre)
Rio de Janeiro, 2004, Editora Record
Coleção Passo-a-passo
Fone: (21) 5852-0000
546 páginas – R$ 64,90

Renata Moehlecke
Ciência Hoje On-line
11/08/04