Eles não são assassinos como pintam os filmes de Hollywood. Tampouco a carne humana faz parte de seus hábitos alimentares. No entanto, ataques de tubarões a pessoas acontecem no mundo todo, inclusive no Brasil. Para mudar esse quadro, o Projeto de Pesquisa e Monitoramento de Tubarões no Estado de Pernambuco (Protuba) captura e marca esses animais por meio de técnicas avançadas que permitem acompanhar o deslocamento dos tubarões e evitar sua aproximação das praias.
Cerca de 120 ataques de tubarões são registrados todo ano no mundo. No Brasil, o Nordeste é a região com maior número de casos. Pernambuco é o campeão brasileiro desse tipo de ocorrência: 53 ataques já foram confirmados desde 1992.
O monitoramento dos tubarões é feito pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) durante o fim de semana, período em que há maior concentração de banhistas nas praias. Um barco da universidade lança o chamado espinhel a cerca de um quilômetro e meio das praias de Boa Viagem e Paiva, em Recife. O equipamento é uma corda de 8 quilômetros de comprimento repleta de linhas secundárias com anzóis em sua extremidade e colocada à meia água para capturar os tubarões que saem do alto-mar em direção à costa.
Além do espinhel, são lançadas próximas à praia linhas de espera, que têm menos anzóis e agem como uma segunda proteção, caso algum tubarão consiga furar o bloqueio do espinhel. Durante o tempo em que permanece no mar, o barco recolhe os animais fisgados e repõe as iscas nos anzóis.
Os tubarões capturados recebem duas marcações, que permitem aos pesquisadores monitorá-los. Uma é um transmissor via satélite chamado PSAT (Pop-up Satellite Archival Tags), que se desprende do animal automaticamente após 45 dias e sobe à superfície para enviar dados como temperatura da água e localização do tubarão para os pesquisadores.
A outra é um transmissor de ondas sonoras que funciona em conjunto com uma rede de receptores acústicos implantada na faixa costeira de Recife. Cada tubarão recebe uma marca que emite uma frequência sonora única. Se o animal se aproxima da costa, os pesquisadores recebem o sinal e podem identificá-lo e monitorá-lo.
Veja como é feita a marcação e o monitoramento dos tubarões pelos pesquisadores da UFRPE.
“Essa tecnologia permite averiguar eventuais padrões de aproximação dos animais para as áreas de risco e de seu retorno para o alto-mar, além de ser extremamente útil na prevenção de ataques, pois possibilita estudar o comportamento das espécies agressivas”, explica o biólogo Fábio Hazin, diretor do Comitê Estadual de Monitoramento e Prevenção aos Ataques de Tubarão (Cemit) e coordenador do Protuba.
Espécies agressivas capturadas
De maio de 2004 a setembro de 2009, foram capturados 42 tubarões potencialmente agressivos, entre eles 23 tubarões-tigre e nove cabeças-chatas, os maiores responsáveis pelos ataques a humanos. Depois de marcados, os tubarões que representam perigo são liberados longe da praia. Os animais que eventualmente morrem no espinhel são levados para o laboratório da UFRPE para estudos ou têm a carne doada para o Núcleo de Apoio às Crianças com Câncer (NACC).
“Se o tubarão for capturado imediatamente após o espinhel ter sido lançado, o máximo que ele vai passar é uma noite preso; mas como o espinhel permite que o animal continue a nadar normalmente, isso não causa nenhum problema”, diz Hazin. O biólogo conta que desde 2006 os anzóis comuns do espinhel foram substituídos por anzóis circulares, que causam menor trauma aos animais e aumentam a probabilidade de sobrevivência pós-captura.
Hazin ressalta que o método utilizado pelo Protuba é um dos mais ecológicos do mundo, pois a maioria dos animais capturados permanece viva. Em outros países, como África do Sul e Austrália, são usadas redes em vez de anzóis para capturar tubarões. O problema é que o sistema de redes também detém outros animais, como tartarugas e golfinhos, que acabam morrendo. “O nosso método é muito mais seletivo, além de fornecer mais informação científica sobre os tubarões por meio das marcações”, explica o biólogo.
Confira um vídeo em que o coordenador do Protuba, Fábio Hazin, explica as causas de ataques de tubarões a humanos.
Preocupação ambiental
O número de ataques de tubarões em Pernambuco teve um crescimento significativo com a criação do Porto de Suape, na Foz do Rio Ipojuca, em 1984. Segundo Hazin, a construção interferiu na dinâmica de reprodução dos animais e é a principal responsável pela sua aproximação da costa. A grande quantidade de matéria orgânica do esgoto doméstico lançado diariamente no mar e o aumento do número de banhistas e embarcações na praia são outros fatores que atraem os tubarões.
Para recuperar o ecossistema desses animais, desde 2006 o Protuba afunda embarcações em alto-mar, a aproximadamente 12 quilômetros da costa. Após cerca de um ano, os pontos dos naufrágios se transformam em uma espécie de recife artificial, que serve de berçário para os tubarões. Além disso, o Protuba promove, em conjunto com o Instituto Oceanário de Pernambuco, ações de educação ambiental em escolas e praias.
Saiba um pouco mais sobre o trabalho de recuperação ambiental do Protuba e assista a um naufrágio controlado na costa de Recife.
Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line