Poluição derreterá geleiras dos Andes

Regiões tropicais montanhosas, como os Andes, devem sofrer os efeitos do aquecimento global de forma mais intensa (foto: Peryassu Souza).

O aquecimento da atmosfera devido ao aumento na concentração de gases poluentes será mais intenso nas altas montanhas do que nas elevações menores, o que provocará o derretimento rápido das camadas de gelo nelas presentes. Esta previsão, publicada na Science de 23 de junho e coordenada por Raymond Bradley, diretor do Centro de Pesquisas Climáticas da Universidade de Massachusetts (em Amherst, Estados Unidos), alerta para os sérios impactos que o fenômeno pode acarretar às cidades próximas, principalmente com relação ao abastecimento de água potável.

Esse impacto foi previsto com o uso de oito modelos climáticos globais. Eles foram programados para prever o ambiente da terra com o dobro da concentração de dióxido de carbono na atmosfera antes das revoluções industriais – patamar que os especialistas acreditam ser alcançado ainda no século 21. Bradley atribui essa diferença de aquecimento entre altitudes a uma convergência de fatores climáticos complexos relacionados com a energia envolvida na evaporação e condensação da água. “Em termos gerais, a circulação atmosférica mudará, produzindo uma redistribuição de calor que afetará mais essas regiões”, afirma.

As geleiras são, em muitas cidades como Quito (capital do Equador), a principal fonte de abastecimento de água potável nos períodos de seca. Além disso, muitos países andinos utilizam a água das geleiras para o cultivo e as hidrelétricas como principal fonte de energia. Esses lugares seriam gravemente afetados pelo desaparecimento das geleiras.

O grupo observou os registros oficiais das temperaturas em 268 montanhas e verificou que já ocorreu um aumento delas, nos últimos 16 anos. Alguns impactos do aquecimento já podem ser observados em diversas áreas – “Geleiras pequenas como a de Chacaltaya, perto de La Paz, Bolívia, quase não existem mais”, conta Raymond Bradley. “Acreditamos que as mudanças observadas serão mais comuns dentro das próximas duas décadas.”

Vigilância
Portanto, para que os governos possam tomar as devidas providências para evitar maiores prejuízos com o derretimento das geleiras, o processo deve ser monitorado mais detalhadamente. Bradley explica que os modelos de clima global usados no estudo fornecem apenas uma ampla noção do problema e que é necessária a sua junção com modelos regionais para determinar especificamente o que pode acontecer em certos vales ou províncias. Ele afirma que o seu grupo já começou um trabalho do tipo em colaboração com o Conselho Nacional do Ambiente do Peru e que outras agências de pesquisas estão muito ativas na Bolívia, Peru e Equador.

As previsões se ativeram às geleiras dos Andes Tropicais, mas o grupo alerta que o mesmo vale para as altas montanhas em qualquer lugar dos trópicos. “Atualmente há um grande foco de atenção sobre essa questão nas regiões polares, mas poucas pessoas vivem lá”, diz Bradley. “Esse trabalho aponta as regiões de altas montanhas como áreas que sofrem mudanças rápidas, com a possibilidade de afetar muitas pessoas.” 

Marina Verjovsky
Ciência Hoje On-line
22/06/2006