“Então o mais fétido e nauseabundo despejo das casas se fazia em barris não tampados que escravos e negros africanos de ganho levavam ao mar, e a rua do Ouvidor, de fácil reta comunicação com a praia, era uma das mais frequentadas pelos condutores dos repugnantes barris, das oito horas da noite até às dez.
A esses barris asquerosos o povo deu a denominação geralmente adotada de – tigres – pelo medo explicável com que todos fugiam deles.”
Mais conhecido hoje como o autor de Memórias da rua do Ouvidor e A Moreninha, o médico e jornalista Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882) foi uma das vozes que alertaram para as condições insalubres da cidade do Rio de Janeiro no período pós-independência. Em meados do século 19, a capital do Império do Brasil estava tomada pelo lixo. Os resíduos, dependendo de sua natureza, eram despejados em ruas, rios, terrenos baldios e até enterrados em quintais. O cenário foi registrado também em ilustrações de artistas-viajantes como Johann Moritz Rugendas (1808-1858), Jean-Baptiste Debret (1768-1848) e cronistas do final do século 19.
Como se vê, os problemas decorrentes do acúmulo de lixo urbano são tão atuais quanto antigos. Não é de hoje que a sociedade – com destaque para governos, profissionais de saúde e ambientalistas – discute a melhor forma de tratamento de resíduos provenientes da limpeza pública e particular. Voltar quase dois séculos na história da cidade pode nos ajudar a entender melhor os desafios do presente.
Inês El-Jaick Andrade
Departamento de Patrimônio Histórico
Casa de Oswaldo Cruz
Fundação Oswaldo Cruz
Éric Alves Gallo
Mestrando do Programa de Pós-graduação em Preservação e Gestão do Patrimônio Cultural das Ciências e da Saúde
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