Radiografoa da hegemonia marítima portuguesa

Foi lançado no Brasil um livro que é um verdadeiro clássico da história da expansão de Portugal entre 1415 e 1825: O império marítimo português . A obra foi escrita em 1969 pelo historiador britânico Charles Ralph Boxer (1904-2000), que foi professor da Universidade de Londres, e já tinha sido traduzida em Portugal.

null O livro revela as causas que fizeram desse país um dos grandes precursores das viagens marítimas, embora fosse pouco povoado e possuísse frota naval incipiente. Boxer analisa instituições, modo de organização, alianças interétnicas e outros aspectos desse império, cuja supremacia na “Era dos Descobrimentos” foi possibilitada pela síntese de elementos econômicos, religiosos, políticos e estratégicos.

Entre os fatores determinantes que teriam influenciado a expansão ultramarina portuguesa, Boxer aponta a obstinação na cruzada contra os muçulmanos, o desejo de obter o ouro da Guiné ou a busca pelas especiarias orientais. Além disso, o desenvolvimento náutico se explica em parte pelo fato de Portugal não ter se envolvido em guerras civis durante o século 15, ao contrário de outros países europeus (a Espanha, por exemplo, atravessava distúrbios internos e não acompanhou o poder de navegação português). Outro fator importante foi a tomada de Ceuta por Portugal em 1415 — a região era estratégica por oferecer acesso ao estreito de Gibraltar.

Boxer comete, porém, uma incorreção ao situar em 29 de outubro de 1825 o reconhecimento formal da independência brasileira por Portugal. Essa formalização foi mediada pela Inglaterra, principal potência do século 19, que se empenhou, devido a interesses político-econômicos, em acordar a paz entre Brasil e Portugal.

O reconhecimento formal de fato se deu três anos após o grito de independência de D. Pedro I às margens do rio Ipiranga, em 7 de setembro de 1822. No entanto, muitos historiadores já apontaram, a partir da análise de fontes primárias, que o reconhecimento ocorreu na verdade no mês de agosto, quando Brasil e Portugal assinaram o Tratado de Paz e Amizade. Esse tratado garantiu autonomia política brasileira em relação aos portugueses, restabeleceu as relações comerciais entre as duas nações e reconheceu D. Pedro I como Imperador do Brasil.

O pequeno deslize não tira, porém, o primor da obra de Boxer. O império marítimo português é uma referência para historiadores e interessados no assunto. A obra é escrita em linguagem acessível e convidativa à leitura — enriquecida por tabelas, gráficos, mapas, ilustrações, fotografias e bibliografia comentada. Conforme ressalta na orelha da edição brasileira o historiador Luis Felipe de Alencastro, professor da Universidade de Sorbonne (Paris/França), o conhecimento aprofundado de japonês, holandês e português facilitou o contato de Boxer com fontes de arquivos dos cinco continentes e transformou-o “no maior especialista do ultramar lusitano”.

 

O império marítimo português (1415-1825)
Charles Ralph Boxer (trad.: Anna Olga B. Barreto).
São Paulo, 2002, Companhia das Letras.
442 páginas – R$ 47,50

Aline Pereira
Especial para a CH on-line
26/05/03