Rapidez e precisão contra picadas de animais venenosos

Deparar-se com aranhas, escorpiões e serpentes enquanto se mexe nos entulhos da casa ou se caminha pela floresta é sempre uma desagradável surpresa. Em caso de picada, além da dor, a vítima sofre com um tratamento impreciso e cheio de efeitos colaterais, que pode, em casos extremos, levar à morte. A fim de minimizar esse sofrimento, foi desenvolvido na Fundação Ezequiel Dias um diagnóstico mais rápido e preciso para identificar picadas de animais peçonhentos.

O escorpião-amarelo ( Tityus serrulatus ) é considerado o mais perigoso do Brasil. O país registra 8 mil casos anuais de picadas por escorpiões

O método se baseia em um exame laboratorial: uma amostra do sangue da vítima é centrifugada para que se identifique em seu plasma o tipo de veneno inoculado. Anticorpos eqüinos específicos são então misturados à amostra do plasma humano numa reação em que é acrescentada uma enzima corante. Quanto maior for a quantidade de veneno inoculada na vítima, mais intensa será sua reação com o anticorpo e mais escura ficará a mistura. A identificação do tipo e da quantidade de veneno leva cerca de 1h30.

Sem o diagnóstico, é preciso esperar os sintomas do envenenamento surgirem, o que pode durar horas, segundo Carlos Olortegui, professor da Universidade Federal de Minas Gerais que realizou o estudo. “Perde-se mais tempo para dar entrada no hospital do que para administrar o soro, cujo tempo de aplicação varia em função da necessidade do paciente”, afirma. Por isso, a precisão no novo diagnóstico favorece a administração precisa da soroterapia.

 

A surucucu é a maior serpente peçonhenta das Américas (acima, a subespécie Laachesis muta muta ). O Brasil registra 20 mil picadas de serpentes por ano

A soroterapia é considerada a única técnica capaz de salvar uma vitima de serpentes, aranhas ou escorpiões. Primeiramente, o veneno do animal peçonhento é introduzido em cavalos, para que produzam anticorpos. O soro do cavalo, após purificação parcial, é então aplicado no homem para reagir com o veneno e neutralizá-lo.

 

Cerca de 40% das pessoas submetidas à soroterapia tradicional sofrem reações, decorrentes da administração do antídoto, como o choque anafilático e a “doença do soro” . Isso pode ocorrer primeiramente porque o diagnóstico é realizado a partir dos sintomas, sem levar em conta a quantidade de veneno inoculado ou a identificação específica do animal que picou a vítima. Além disso, apenas uma pequena parcela do soro do cavalo contém anticorpos próprios para o veneno. Todo o resto não age diretamente no combate ao veneno e prejudica o tratamento.

O perigo da superdosagem pode ser superado no novo diagnóstico, pois a análise laboratorial aponta a quantidade exata da peçonha inoculada e determina assim a dose correta do soro a ser aplicada. Outra vantagem do método é o baixo custo: “os reagentes usados nas análises são nacionais”, justifica Olortegui. Já existe uma proposta de distribuição de kits-diagnóstico para unidades de saúde de regiões onde o índice de acidentes com animais peçonhentos é alto. No entanto, a técnica precisa ser avaliada pelo Ministério da Saúde antes da implantação definitiva.

Embora o novo método seja valioso para os casos mais graves, 85% das picadas de animais peçonhentos são consideradas leves e o tratamento pode ser feito por analgésicos. No Brasil, 20 mil pessoas são picadas por serpentes, 8 mil por escorpiões e 5 mil por aranhas todo ano.

Andreia Fanzeres
Ciência Hoje on-line
11/06/03