Julho de 1960. A jovem britânica Jane Goodall, uma apaixonada pela África ainda sem qualquer formação acadêmica, visita pela primeira vez o Parque Nacional Gombe Stream, na Tanzânia, para observar o comportamento dos chimpanzés, em expedição estimulada pelo antropólogo Louis Leakey, da Universidade de Cambridge (Reino Unido), de quem era assistente.
Cinco décadas depois, Goodall é reconhecida como a mais importante especialista em chimpanzés do mundo e continua uma frequentadora assídua daquele parque, onde conduziu a maior parte de seus estudos de observação desses primatas.
No cinquentenário de sua expedição pioneira, a etóloga e primatóloga vem a público chamar a atenção para a ameaça que paira sobre nossos primos mais próximos.
“Precisamos mudar drasticamente nossa maneira de lidar com a natureza e buscar avanços na ciência e na tecnologia se ainda quisermos salvar [essa espécie]”, alerta o artigo que Goodall publica esta semana na revista Nature, em parceria com o especialista em conservação ambiental Lilian Pintea. A dupla clama por ações imediatas para salvar a espécie de extinção.
Durante todas essas décadas em que estudou os chimpanzés, Goodall fez descobertas cruciais para a primatologia. Diferentemente de qualquer outro cientista, ela deu nome a cada animal estudado e foi a única humana a conseguir viver entre eles.
Descobriu que esses animais podem ser tão agressivos e emocionais quanto nós – o que só vem corroborar estudos que apontaram a profunda semelhança fisiológica e genética entre as duas espécies (a diferença é da ordem de mero 1,5% do genoma).
Perspectiva sinistra
Goodall lamenta que, à medida que nosso conhecimento sobre os chimpanzés aumentou, sua ocorrência tem diminuído vertiginosamente. Estima-se que, em 1900, havia mais de um milhão de espécimes na África.
Hoje, apesar de esforços de conservação, apenas 300 mil permanecem nas selvas, muitos deles em populações fragmentadas ou isoladas. Os mais alarmistas preveem que eles estarão extintos na natureza em até 30 anos.
A maior ameaça aos chimpanzés é o desmatamento, como Goodall constatou sobrevoando o parque Gombe Stream. Para conter o ritmo crescente de derrubada da mata, defende ela, o apoio das populações vizinhas é essencial.
“A pobreza, aliada à falta de itens básicos como água limpa, saúde e educação e a métodos de cultivo não sustentáveis estavam causando uma seca e erosão terríveis”, contam Goodall e Pintea no artigo. “Se ajudássemos a população local a melhorar sua vida, eles poderiam se tornar nossos parceiros na conservação.”
Para isso, o Instituto Goodall, fundado pela especialista e que tem Lilian Pintea como diretora de conservação, desenvolveu um projeto que alia medidas de conservação tradicionais ao uso sustentável do solo e a tecnologias de sensoriamento remoto.
Com base em imagens de satélite, foi possível determinar a distribuição espacial dos chimpanzés dentro e fora das áreas protegidas e determinar estratégias para um convívio harmônico entre esses primatas e a população local.
“Não há tempo há perder nessa batalha para salvar os chimpanzés”, concluem as autoras.
Larissa Rangel
Ciência Hoje On-line