Os tubos de pitot são instrumentos que medem a velocidade do avião com base na pressão exercida pelo ar sobre uma abertura em sua extremidade. Uma falha nesses sensores foi apontada como um dos precursores do acidente com o voo 447 da Air France, em maio de 2009.
Para evitar tragédias como aquela, Renato Cotta e Átila Freire, professores de engenharia mecânica do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), coordenam um projeto no qual repensam a estrutura dos pitots e a própria segurança aérea, além de contribuir para a inovação na área.
Na ocasião do acidente, o sistema de aquecimento interno do instrumento não foi suficiente para evitar que as gotículas de água super-resfriadas, presentes nas nuvens pelas quais passava o avião, se congelassem na extremidade do sensor, prejudicando, assim, a leitura da pressão e, consequentemente, da velocidade da aeronave.
Sem os dados de velocidade, o piloto automático do avião foi desligado e os pilotos de verdade passaram a controlar a aeronave. Com apenas quatro minutos para agir, em situação estressante e sem qualquer informação confiável, falharam nas tentativas de contornar o problema, perdendo o controle do avião.
Construção e uso multidisciplinares
O estudo desenvolvido na Coppe é dividido em três iniciativas paralelas: a construção de um túnel de vento climático para testar os tubos de pitot, o aprimoramento dos instrumentos já existentes e a mudança nas técnicas de medição utilizadas atualmente nos sensores aeronáuticos.
A proposta mais ambiciosa do projeto é construir um túnel de vento onde se possa testar os tubos de pitot num cenário ao menos próximo àquele encontrado pela aviação civil hoje. Trata-se de uma construção vertical de 7,5 metros de comprimento e 3,5 metros de altura, feita de aço galvanizado, com isolamento de lã de vidro e acabamento externo constituído de uma película de PVC branco.
Nessa estrutura serão reproduzidas as condições climáticas – como temperatura, umidade e formação de gelo – encontradas em altitudes de até sete quilômetros, aproximadamente 20 mil pés.
De acordo com Freire, o túnel fomentará a interação entre diversas áreas e poderá ser utilizado em uma série de estudos. “O que temos aqui é interdisciplinar, na verdade, multidisciplinar, não só com relação à construção, mas também quanto ao uso, já que poderá ser utilizado para diversos outros propósitos”, ressalta.
Entre os setores que podem ser beneficiados está o de frigoríficos, meteorologia e ainda outras iniciativas na aeronáutica. Inclusive a Embraer já se mostrou interessada na utilização do túnel, conta o pesquisador.
Velha tecnologia, novos desafios
As outras duas metas do projeto ocorrem simultaneamente e de maneira complementar. Os pesquisadores vão repensar a velha técnica de funcionamento dos tubos de pitot, aproveitando o que funciona bem e alterando o que ainda deixa a desejar.
“O equipamento pode ser melhorado de diversas maneiras, como na escolha de outros materiais, geometrias e técnicas de aquecimento”, reforça Cotta.
Em aviões comerciais de grande porte, como o do voo AF 447, existem três tubos de pitot que oferecem uma suposta redundância dos sistemas. Mas, por serem iguais e terem as mesmas características, todas as unidades, sob as mesmas condições climáticas, são suscetíveis aos mesmos problemas.
“Se um pitot congelar em uma determinada situação, os demais estarão suscetiveis à mesma falha”, diz Cotta. “O que queremos é que haja mais de uma técnica de medida de velocidade disponível em voos comerciais, não mais uma redundância de número do mesmo instrumento.”
Por isso os pesquisadores também pretendem desenvolver técnicas e instrumentos completamente novos. Uma das possibilidades consideradas é a elaboração de medidores menores, que exigiriam um consumo de energia mais baixo para prevenir seu congelamento. A ideia é que esses microsensores possam medir a velocidade não só nos três pontos já monitorados, mas em outros distribuídos pelo avião.
“Acho que está na hora de fazermos uma contribuição científica que traga um estímulo à inovação tecnológica nessa área em um curto espaço de tempo”, conclui Freire.
Ana Carolina Correia
Ciência Hoje On-line