Seqüenciada bactéria que produz ‘adubo natural’

 

 

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A H. seropedicae é capaz de capturar o nitrogênio da atmosfera e transformá-lo em nutriente para as plantas (foto: J. I. Baldani / Embrapa Agrobiologia)

A ciência brasileira acaba de engrossar a lista de seres vivos que tiveram seu genoma descrito. Pesquisadores paranaenses concluíram o seqüenciamento da bactéria Herbaspirillum seropedicae , que tem função vital para as plantas. O mapeamento, que pode representar uma economia de centenas de milhões de reais por ano, foi finalizado no final de 2004, mas ainda não foi publicado, pois os cientistas estão estudando os genes para saber quais patentes podem ser requeridas. O estudo demorou dois anos e meio para ser concluída e envolveu 137 cientistas.

A Herbaspirilum seropedicae é conhecida há cerca de 20 anos, quando foi descoberta por cientistas da Embrapa Agrobiologia. Ela chama a atenção por seu grande interesse econômico. “Esse microrganismo é um adubo natural, só na cultura do milho ela reduzirá em US$ 420 milhões os gastos anuais brasileiros”, afirma Fábio Pedrosa, coordenador da pesquisa e professor do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Essa bactéria só é encontrada no interior de plantas e está presente em diversas espécies de interesse agrícola, como milho, trigo, arroz e cana-de-açúcar. O microrganismo é capaz de fazer a fixação biológica do gás nitrogênio (N 2 ) presente na atmosfera, ou seja, capturá-lo e transformá-lo em amônia (NH 3 ), um nutriente importante para as plantas. Esse processo é fundamental para os vegetais, pois só assim eles podem assimilar e utilizar o nitrogênio do ar.

Ao fixar o nitrogênio, a H. seropedicae evita o uso de fertilizantes que poluem o solo. “Essa bactéria atua como um biofertilizante nitrogenado, o que reduz a agressão ao meio ambiente”, explica Pedrosa. “Ela invade o organismo vegetal e, em vez de provocar doenças, promove seu crescimento.”

Foram seqüenciados mais de cinco mil genes de genes, dos quais 57% já têm função conhecida. Já foram identificados os genes envolvidos na fixação de nitrogênio e sua regulação. “Estudávamos esses genes desde 1985”, conta Pedrosa. “O genoma veio revelar todos os genes envolvidos no processo. Queremos agora realizar alterações genéticas para que estimule a maior produção de amônia nos vegetais e entender melhor suas características.”

Os pesquisadores esperam ainda encontrar genes de interesse medico, farmacológico e ambiental na H. seropedicae . Ela tem, por exemplo, um gene que codifica a produção da asparaginase. Normalmente extraída da bactéria Escherichia coli, essa enzima é comumente usada para o controle de um tipo de leucemia. Foram encontrados também genes para a síntese de uma enzima fundamental para a despoluição de ambientes contaminados com explosivos como o TNT. Assim, a economia que por ora se restringe à área agrícola poderia se estender também à indústria farmacêutica, entre outras.

Os pesquisadores estão envolvidos agora com a garimpagem dos dados obtidos durante o seqüenciamento, para entender em detalhes a biologia da H. seropedicae . A equipe está estudando também o proteoma da bactéria, para determinar a regulação de seus genes em diferentes condições fisiológicas. “Temos muito o que fazer”, resume Pedrosa. Ele estima que os benefícios econômicos derivados da pesquisa comecem a surgir dentro de três a cinco anos.

Pedro Gomes Ribeiro
Ciência Hoje On-line
21/02/05