Doenças renais crônicas, obesidade, depressão… Décadas atrás, era impensável a ideia de que tais enfermidades pudessem atingir cães, gatos e outros animais. Hoje, porém, a medicina veterinária enfrenta casos antes considerados tipicamente ‘humanos’. Mais que uma evolução dos métodos de diagnóstico, a mudança pode ser reflexo da influência dos donos sobre a saúde de seus animais domésticos.
A constatação é do antropólogo Jean Segata, que observou o dia a dia de uma clínica veterinária no município catarinense de Rio do Sul. Com base nessa experiência, ele desenvolveu sua tese de doutorado, ‘Nós e os outros humanos, os animais de estimação’, defendida recentemente na Universidade Federal de Santa Catarina.
Entre os diversos casos que acompanhou na clínica, Segata destaca a depressão canina. Embora sua ocorrência não seja uma unanimidade no meio acadêmico, a doença tem preocupado veterinários e, também, donos de animais.
Em humanos, a possibilidade de expressar sentimentos e angústias por meio da fala facilita o diagnóstico da depressão. Em cães, entretanto, é preciso ficar atento ao comportamento do animal. Apatia, perda de apetite e busca de isolamento são sinais de que o animal pode estar deprimido. Como acontece com seres humanos.
Se os sintomas de depressão são os mesmos em cães e humanos, há semelhança também no tratamento da doença, com uso de psicotrópicos e psicoterapia. No caso dos animais, os donos são instruídos a mudar algumas atitudes em relação a eles, como passar mais tempo em sua companhia, levá-los para passear, melhorar sua alimentação, permitir a convivência com outros cães.
Comportamento contagioso?
Durante a pesquisa, Segata observou 40 casos diagnosticados como ‘depressão canina’. Muitas vezes, diz o pesquisador, os donos desses cães também apresentavam sinais de depressão.
“Nenhum deles informou que tinha sido diagnosticado como deprimido por um psiquiatra, mas alguns relataram que costumavam dividir comprimidos ‘tarja-preta’ [expressão comumente usada para fazer referência a medicamentos controlados, como antidepressivos] com seus animais.”
Do total de casos de depressão canina observados por Segata, 75% eram em fêmeas. Novamente, surge um paralelo com os seres humanos, pois a depressão é mais comum entre mulheres.
Tais semelhanças levantam a seguinte questão: humanos deprimidos não poderiam provocar depressão em seus animais de estimação? Se for o caso, não seria a primeira vez que o comportamento do dono influencia o animal.
Estudo recente da Associação para a Prevenção da Obesidade entre Animais de Estimação mostra que 55% dos cães e 52% dos gatos dos Estados Unidos estão acima do peso. O país é conhecido, entre outros aspectos, pelo alto índice de obesidade em sua população.
Segata afirma que é difícil encontrar trabalhos acadêmicos que tratem da relação entre seres humanos e animais de estimação. Isso porque, segundo o antropólogo, muitos acreditam que essa relação deveria ser meramente biológica, e não social ou emocional.
Guilherme de Souza
Especial para a CH On-line/ PR