A inserção de quatro novos genes em fibroblastos (células adultas da pele, representadas acima) permitiu reprogramá-los de forma que se comportassem como células-tronco embrionárias, capazes de se diferenciar em diversos tipos celulares (foto: Junying Yu/University of Wisconsin-Madison).
Pode cair por terra o principal obstáculo ético e legal para a obtenção de células-tronco embrionárias, apontadas como possível fonte de tratamento para várias doenças. Dois estudos conseguiram reprogramar células adultas da pele humana para que se tornassem capazes de se diferenciar em vários tecidos. A técnica dispensa o uso de embriões, criticado por opositores à pesquisa com esse tipo de células e proibido em alguns países.
O método já havia sido demonstrado com sucesso em camundongos em julho de 2006. Desde então, laboratórios do mundo inteiro vinham tentando aplicá-lo com êxito em células humanas. O feito foi obtido de forma independente por dois grupos. A equipe de James Thomson, da Universidade de Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos, publicou seus resultados na revista Science. O periódico Cell traz o artigo do time liderado por Shinya Yamanaka, da Universidade de Quioto, no Japão – o mesmo que havia mostrado a eficácia da técnica em roedores.
A novidade foi divulgada poucos dias depois da obtenção das primeiras células-tronco embrionárias de primatas geradas por meio de clonagem. Esse anúncio havia sido recebido como um sinal de que estaríamos mais próximos da clonagem terapêutica de humanos, na qual células-tronco obtidas de embriões poderiam ser usadas no futuro em terapias celulares contra doenças como o mal de Parkinson ou lesões da medula espinhal.
No entanto, a obtenção de células-tronco embrionárias sem a necessidade do uso de embriões – e da conseqüente destruição dos mesmos – pode tornar desnecessário o procedimento de clonagem. Se for confirmada a capacidade da técnica de gerar células capazes de se diferenciar sem riscos, a pesquisa de terapias celulares deve ganhar um fôlego considerável. “O método vai mudar completamente o campo da pesquisa com células-tronco”, aposta James Thomson.
Quatro novos genes
Os dois grupos usaram métodos similares para chegar ao mesmo resultado. Ambas as equipes inseriram quatro novos genes em fibroblastos – células adultas da pele facilmente cultiváveis em laboratório. A inserção desses genes permitiu reprogramar as células de forma que elas se comportassem como se fossem pluripotentes, ou seja, capazes de se diferenciar em diversos tipos celulares especializados.
Ainda não está claro o grau de semelhança entre as células da pele reprogramadas e as células-tronco embrionárias. “Vai levar alguns anos até que possamos realmente compreender as células reprogramadas assim como entendemos as células-tronco embrionárias”, reconhece Thomson em declaração dada à Science.
O uso efetivo da nova técnica para a pesquisa de terapias celulares depende ainda de aperfeiçoamentos. É preciso, por exemplo, desenvolver métodos para eliminar os vírus usados como vetor para a inserção dos novos genes e para garantir que esses genes não sejam incorporados ao genoma dos fibroblastos. De qualquer forma, os autores sublinham que o método deve ser importante para gerar modelos para o estudo de doenças e para o desenvolvimento de novas drogas.
Bernardo Esteves
Ciência Hoje On-line
21/11/2007