Terapia do futuro requer cautela

 

 Considerados a grande promessa da medicina para este século, os tratamentos baseados em células-tronco trazem esperança de cura para diversas doenças, como o mal de Alzheimer e a paraplegia. Embora as pesquisas se concentrem nas células de origem embrionária, aquelas chamadas adultas também são alvo de estudo. Os resultados têm mostrado que elas são seguras e altamente resistentes à transformação em câncer. No entanto, um estudo recente indica que é preciso cautela nas aplicações dessa terapia: em artigo publicado na edição de 15 de abril da revista científica Cancer Research , pesquisadores espanhóis mostraram que, quando multiplicadas em laboratório por muito tempo, as células-tronco adultas podem se transformar em tumores.

 
Diferentemente de suas equivalentes embrionárias, que podem dar origem a um organismo inteiro e se diferenciar em qualquer linhagem celular, as adultas têm uma capacidade limitada de diferenciação. As células-tronco mesenquimais (CTM), em particular, têm muitas aplicações médicas, já que podem ser multiplicadas fora do corpo e gerar diversos tipos celulares, como osteócitos (ossos) e adipócitos (tecido adiposo). “Nossa intenção é entender as CTM para, no futuro, poder usá-las em tratamentos de modulação do sistema imune”, conta o biólogo Javier Garcia Castro, da Universidade Autônoma de Madrid e um dos autores do artigo, em entrevista à CH On-line .
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Células tumorais no pulmão de camundongos imuno-deficientes que receberam células-tronco adultas
(foto: Javier Garcia Castro)

O grupo isolou amostras de CTM de tecido adiposo humano, as multiplicou em laboratório e as injetou em camundongos imunodeficientes após períodos determinados de tempo. A primeira injeção ocorreu com CTMs que haviam proliferado por três meses e não causou qualquer espécie de tumor. O segundo grupo de células injetado cresceu por mais três meses, ultrapassando a senescência – um das duas fases que sinalizam o fim da longevidade da célula – e também não levou ao aparecimento de tumores, embora apresentassem uma cópia extra (trissomia) do cromossomo 8.

 
Finalmente, os pesquisadores injetaram nos camundongos células mesenquimais cultivadas por até sete ou oito meses. Nesse período, elas haviam passado pela etapa definitiva da vida de uma célula, chamada fase de crise, e haviam adquirido características tumorais. Essas linhagens geraram não só problemas de saúde nos animais, como também tumores em quase todos os órgãos. Além disso, essas células possuíam diversas anomalias cromossômicas específicas.
 
Segundo os pesquisadores, a transformação espontânea das CTM em tumor é um fenômeno extremamente raro, mas a alta incidência encontrada no experimento – 50% – sugere que o evento não é aleatório e, sim, resultado de um programa genético. Essa transição poderia servir como modelo para estudar a origem e evolução do câncer nos humanos. “Precisamos entender melhor a biologia das CTM de maneira a estabelecer critérios de segurança pra o seu potencial uso clínico”, explica Castro, cujo grupo pretende agora estudar as causas da transformação verificada.

Fred Furtado
Ciência Hoje On-line
30/05/05