Trabalhar mais depois de velho?


Pirâmide etária da população da Alemanha nos anos de 1910, 2005 e 2025. Projeções indicam que a população com mais de 60 anos será superior à de jovens até 2025 (reprodução / Science ).

Redistribuir o trabalho entre as faixas etárias é a sugestão de demógrafos europeus para solucionar os problemas decorrentes do envelhecimento da população. Eles defendem que, quanto mais velho for o indivíduo, maior deveria ser sua carga horária de trabalho, porque não faria sentido trabalhar mais tempo durante o período da vida em que é preciso cuidar dos filhos. Esta pode ser ainda uma das causas da baixa taxa de natalidade dos países desenvolvidos, segundo os autores do artigo que apresenta a proposta, publicado na revista Science .

“Ações governamentais deveriam encorajar os idosos a trabalhar uma quantidade maior de horas durante mais tempo, além de estimular a criação de empregos de meio-período para os mais jovens”, explica James Vaupel, pesquisador do Instituto Max Planck para Pesquisa Demográfica (Alemanha) e um dos autores do artigo, em entrevista à CH On-line . Ele acredita que, em teoria, o padrão econômico não cairia com a redução do tempo trabalhado no início da idade adulta. “Embora os jovens trabalhem menos, não haverá redução de renda. Os impostos diminuirão, porque a necessidade de transferir recursos financeiros dos ativos para os inativos será menor”, ressalta.

A grande quantidade de idosos desestabiliza as contas públicas, pois cada vez menos pessoas trabalham para sustentar um número crescente de aposentadorias, o que torna o sistema previdenciário quase inviável e provoca a redução dos investimentos em educação e saúde, por exemplo.

Os autores do artigo estudaram mais cuidadosamente o caso alemão. Nesse país, havia cinco trabalhadores inativos para cada quatro ativos em 2005, e a projeção é que em 2025 a proporção seja de três para dois. Além disso, atualmente os empregados trabalham cerca de dezesseis horas por semana; em 2025, estima-se que esse valor será 8% menor. A inclusão dos idosos poderia aumentar essa média para cerca de 25 horas.

O fantasma do colapso do sistema previdenciário ameaça, além da Alemanha, quase todos os países da Europa, onde as aposentadorias antecipadas têm sido incentivadas. A partir dos 60 anos, é mais vantajoso financeiramente se aposentar do que continuar trabalhando. Na Bélgica, por exemplo, mais da metade da população masculina com mais de 59 anos estava fora do mercado de trabalho em 2000. É esse erro que todos os modelos teóricos sobre o assunto procuram corrigir.

“A idéia básica dessas alternativas é estimular o cidadão a trabalhar por mais tempo”, salienta o economista Bernardo Lanza, pesquisador do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Universidade Federal de Minas Gerais (Cedeplar/UFMG). Ele avalia com cautela a proposta dos demógrafos alemães. “Ainda não podemos dizer que a redistribuição do trabalho entre as diferentes faixas etárias será eficiente, porque não houve nenhum estudo empírico”, pondera.

O mapa classifica os países em função da idade média de sua população em 2001. Os países mais ricos, na Europa e na América do Norte, têm idade média entre 35 e 45 anos. Na maior parte da África e do Oriente Médio, a média fica entre 14 e 20 anos. O Brasil está entre esses extremos, com idade média de 25 a 30 anos (reprodução / Wikipedia).

O caso do Brasil
O envelhecimento populacional ainda atinge apenas os países mais ricos de forma mais acentuada, mas a tendência é que ele se torne um problema mundial no futuro. Segundo estimativas da Organização das Nações Unidas, a média de idade brasileira está entre 22 e 28 anos atualmente, mas deve subir para entre 35 e 42 anos em 2050, o que significa que o país está próximo de ter problemas por causa da grande quantidade de aposentados.

De acordo com estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população brasileira de idosos será igual à de jovens aproximadamente em 2050. Além disso, a relação entre trabalhadores ativos e inativos do país está cada vez mais parecida com a européia. Na década de 1950, havia oito trabalhadores no mercado para cada aposentado; atualmente a taxa é de 1,27 para 1. Dentro de pouco tempo, cada trabalhador ativo vai sustentar um inativo, o que tornará a carga tributária inviável.

Pirâmides de idade da população brasileira em 2005 e 2050. O gráfico tende a tomar a forma de um quadrado, o que reflete o envelhecimento populacional (reprodução / IBGE).

A tentativa de aumentar a idade de aposentadoria no Brasil vem desde o início da década de 1990. “Há incentivos para aposentadoria precoce em alguns tipos de emprego. Outra alternativa seria oferecer benefícios aos trabalhadores que continuarem no mercado”, explica Bernardo Lanza. “Em todo caso, é importante mudar o sistema previdenciário logo. Quanto mais cedo o país começar a se preocupar em fazer políticas públicas para evitar esse colapso, melhor.” 


Franciane Lovati
Ciência Hoje On-line
01/08/2006