Uma tecnologia desenvolvida na Universidade de São Paulo promete diminuir os custos do tratamento do esgoto. Trata-se de um reator capaz de remover tanto a matéria orgânica quanto o nitrogênio – elemento potencialmente prejudicial à saúde humana – presentes nos resíduos gerados por fábricas e residências, o que torna esse sistema de limpeza mais simples e barato que os usados atualmente.
“Hoje em dia é necessário usar dois ou mais reatores para retirar o nitrogênio e a matéria orgânica, o que encarece a limpeza dos esgotos”, explica o engenheiro ambiental Rafael Brito de Moura, que desenvolveu a nova tecnologia durante seu mestrado, sob a orientação do engenheiro sanitário Eugenio Foresti.
Moura conta que o reator é composto por um cilindro de acrílico com espumas de poliuretano em seu interior – idênticas às usadas para fabricar colchões. “Essa espuma serve como base para o crescimento de bactérias que adicionamos ao reator e que são capazes de limpar o esgoto.”
Segundo o pesquisador, a remoção do nitrogênio do esgoto é dividida em duas fases. A primeira é feita por bactérias nitrificantes, que só sobrevivem na presença de oxigênio; já a segunda é executada por bactérias desnitrificantes, que morreriam em contato com esse gás. Por isso, os sistemas atuais usam dois reatores diferentes – um com e outro sem oxigênio – para limpar o esgoto.
“A grande sacada do nosso projeto foi proporcionar um ambiente aeróbio para as bactérias nitrificantes do lado de fora das espumas, onde entrarão em contato com oxigênio, enquanto as desnitrificantes ficam no interior das espumas, longe desse gás”, revela o engenheiro. “Assim, é possível remover o nitrogênio usando um reator só, o que torna tudo mais barato.”
Para os testes, Moura construiu um reator capaz de tratar 12 litros de esgoto por dia. O esgoto usado foi produzido artificialmente a partir de proteínas da carne e alguns açúcares e adquiriu características físicas e químicas bem próximas às dos detritos naturalmente gerados.
“Os resultados mostram que nosso reator foi capaz de remover 80% do nitrogênio e mais de 90% da matéria orgânica presente no esgoto testado”, afirma.
Reações químicas
A limpeza do esgoto começa com a atuação das bactérias nitrificantes. Durante duas horas, o reator recebe um fluxo de oxigênio, que é usado pelas bactérias para transformar o nitrogênio – presente no esgoto na composição da amônia, substância altamente prejudicial para o ser humano e o meio ambiente – em uma molécula com um átomo de nitrogênio e três de oxigênio chamada nitrato.
A partir daí, o fluxo de oxigênio cessa por uma hora para que as bactérias desnitrificantes transformem o nitrato em nitrogênio gasoso (composto por dois átomos de nitrogênio), que segue para a atmosfera, onde é naturalmente abundante e não causa danos ao meio ambiente. Esse ciclo se repete continuamente.
Moura explica que o processo de remoção do nitrogênio do esgoto fornece energia para que as bactérias continuem crescendo dentro do reator, enquanto a matéria orgânica presente no esgoto é fonte de carbono para que elas se mantenham vivas e se multipliquem. “Isso faz com que o reator não precise ser trocado, pois ele se renova constantemente com a proliferação desses microrganismos. Apenas o excesso de bactérias deve ser descartado periodicamente, como em qualquer sistema de tratamento biológico.”
O pesquisador ressalta que o nitrogênio e a matéria orgânica encontrados no esgoto são vantajosos apenas para as bactérias. Quando descartados de modo irregular, eles geram mau cheiro e aceleram a proliferação de algas em rios e lagos, o que diminui a quantidade de oxigênio nesses ambientes, causando a morte de muitos peixes.
Além disso, caso o nitrogênio do esgoto vá parar em águas usadas para consumo humano, ele pode causar vários problemas de saúde, como câncer no estômago e metahemoglobinemia, doença que gera quadros graves de anemia.
Em seu doutorado, Moura está desenvolvendo um reator maior e tem feito testes com esgoto sanitário real. “O projeto cresceu e muitas pessoas estão trabalhando no reator. Em uma perspectiva otimista, espero que esse modelo esteja disponível no mercado dentro de cinco anos.”
Mariana Rocha
Especial para a CH On-line