Um futuro sombrio

Logo depois de ser descrito, em 1926, o pica-pau-do-parnaíba (Celeus obrieni), que ocorre em Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Maranhão e Piauí, não foi mais encontrado. Sua ‘redescoberta’, em 2006, veio acompanhada de uma preocupação: o risco de extinção, segundo biólogos do Grupo de Pesquisa em Ecologia e Conservação de Aves da Universidade Federal do Tocantins (UFT), que estudam a espécie desde 2008.

Durante seis meses, a equipe da UFT, liderada pelo ornitólogo Renato Torres Pinheiro, monitorou seis indivíduos em reservas legais de propriedades particulares, através do sistema de radiotelemetria. Além de revelar hábitos da espécie ainda não conhecidos, o monitoramento – feito com o auxílio de minúsculos aparelhos instalados no corpo da ave – mostrou que a degradação do cerrado, bioma em que ela ocorre, é a principal ameaça à sua sobrevivência.

Por ter permanecido muito tempo sem ser avistado, o pica-pau-do-parnaíba foi incluído na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza

Por ter permanecido muito tempo sem ser avistado, o pica-pau-do-parnaíba foi incluído na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza. Após sua redescoberta e em razão dos estudos que passaram a ser feitos, ele se mantém na lista, porém em uma categoria menos crítica. Entretanto, não está na Lista Nacional das Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção, do Ministério do Meio Ambiente. Mas, segundo Pinheiro, sua inclusão já foi sugerida.

A equipe da UFT ainda não pôde estimar com segurança o tamanho da população da espécie. Mas os pesquisadores a calculam em cerca de 20 mil casais. “Trata-se de uma população relativamente pequena”, avalia Pinheiro.

Ameaça agrícola

Com cerca de 20 cm e pesando em média 100 g, o pica-pau-do-parnaíba tem hábitos alimentares bastante específicos, o que aumenta a preocupação com o seu futuro: alimenta-se de formigas que vivem dentro do bambu conhecido popularmente como taboca (Guadua paniculata). Das 20 espécies de formiga encontradas na taboca, só quatro fazem parte do cardápio do animal, que fura a planta para capturá-las.

Bambu
Bambu ‘Guadua paniculata’, espécie comum no cerrado brasileiro. (foto: Alex Popovkin/ Wikimedia Commons – CC BY 2.0)

C. obrieni vive principalmente no chamado cerrado florestal, ou cerradão, uma das fisionomias do cerrado. Para se alimentar e reproduzir, precisa de uma área de aproximadamente 250 hectares; em alguns casos, requer até 500 hectares. Segundo os pesquisadores, é difícil encontrar áreas de cerradão preservado nessas dimensões hoje em dia.

De solo fértil, o cerradão é muito visado para a agricultura. A devastação para plantios acaba então criando fragmentos isolados de mata, de tamanhos menores que o necessário para a sobrevivência da espécie.

“Quase 95% dos fragmentos de área preservada têm menos de 50 hectares”, afirma Pinheiro. Segundo ele, o isolamento desses territórios devido à expansão de áreas agrícolas inibe o deslocamento dos animais. “Em médio e longo prazo, o contínuo processo de fragmentação pode levar a espécie à extinção.”

Estratégias de conservação

Com o resultado dos estudos, o pica-pau-do-parnaíba passou a integrar o Plano de Ação Nacional das Aves do Cerrado, elaborado pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação das Aves do Cerrado. No documento estão explicitadas as propostas de ações de conservação de várias espécies do bioma.

No caso de C. obrieni, a primeira medida de conservação sugerida é a criação de unidades de proteção integral

No caso de C. obrieni, a primeira medida sugerida é a criação de unidades de proteção integral. Também estão sendo estudadas propostas de incentivo para transformar propriedades privadas em reservas particulares do patrimônio natural, conhecidas como RPPNs.

“Se quisermos que o pica-pau-do-parnaíba continue a fazer parte da nossa fauna, será preciso que as ações sugeridas no plano se tornem realidade”, alerta Pinheiro.

Franciele Petry Schramm
Especial para a CH On-line/ PR