Compostos associados a bactérias presentes em certos ambientes aquáticos estimulam as fêmeas do Aedes aegypti a colocarem ovos (foto: Shawn G. Kennedy).
A descoberta de substâncias químicas que estimulam o Aedes aegypti a colocar ovos pode auxiliar o desenvolvimento de armadilhas mais eficazes para seu monitoramento e combate. Um estudo norte-americano constatou que as fêmeas do mosquito põem mais ovos em contato com compostos produzidos por microrganismos presentes em ambientes aquáticos com folhas imersas, o que faz com que passem mais tempo nesses locais.
O Aedes aegypti transmite a dengue e a febre amarela, doenças que são uma ameaça à saúde pública, especialmente nos países tropicais. Estima-se, por exemplo, que ocorram 51 milhões de casos de dengue anualmente no mundo. O uso de compostos que modifiquem o comportamento do mosquito, como estimulantes da postura de ovos, permitirá detectar e vigiar sua atividade em regiões endêmicas, bem como diminuir a ocorrência dessas doenças por meio da adoção de mecanismos de controle das populações do A. aegypti.
As fêmeas do A. aegypti põem seus ovos em locais com água limpa e parada. Seu comportamento durante essa atividade é mediado por vários estímulos associados ao hábitat aquático onde a larva cresce. Estímulos visuais atraem os mosquitos, que são guiados por estímulos olfativos para locais com água. Na aterrissagem, o contato com a superfície da água estimula a colocação de ovos.
A origem de alguns desses estímulos acaba de ser identificada. Uma equipe liderada por pesquisadores da Universidade do Estado da Carolina do Norte verificou que as fêmeas do A. aegypti preferem colocar seus ovos em ambientes aquáticos com folhas de bambu (Arundinaria gigantea) e carvalho (Quercus alba). A explicação para essa preferência é a presença de bactérias que produzem certos ácidos carboxílicos e ésteres que agem como potentes estimulantes.
Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores fizeram vários testes, nos quais as fêmeas do mosquito podiam escolher entre infusões de bambu normais e esterilizadas e água filtrada e acrescida de bactérias retiradas das infusões. Os experimentos comprovaram que as substâncias que estimulam a colocação de ovos estão associadas aos microrganismos e não ao líquido. Resultados similares foram obtidos em testes com folhas de carvalho.
Durante os experimentos, o recipiente com uma mistura de bactérias isoladas de infusões de folhas de bambu (à direita) recebeu muito mais ovos de A. aegypti do que aquele com líquido esterilizado (à esquerda) (foto: PNAS).
Em uma segunda etapa, os cientistas identificaram e cultivaram em laboratório 14 bactérias isoladas das infusões de bambu e 18 das de carvalho. Depois, deixaram fêmeas de A. aegypti escolherem entre recipientes com líquido esterilizado e outros com essas bactérias.
“Juntos, os resultados desses experimentos de comportamento indicam que estímulos associados com microrganismos em infusões de plantas direcionam as fêmeas prenhes de A. aegypti a depositarem mais de 90% de seus ovos em recipientes enriquecidos com micróbios”, dizem os autores no artigo que relata a descoberta, publicado na PNAS desta semana.
Estimulantes X inibidores
Os compostos estimulantes foram então identificados pela equipe e sua eficácia foi avaliada em testes com fêmeas do mosquito. Os resultados mostram que algumas substâncias associadas aos microrganismos induzem, em concentrações específicas, a colocação de ovos. Mas os mesmos compostos em níveis mais altos ou substâncias diferentes produzidas pelas mesmas ou por outras bactérias inibem essa atividade.
Os cientistas explicam que as fêmeas do A. aegypti usam um mecanismo minucioso para selecionar os locais onde colocarão seus ovos. “Altas concentrações de estimulantes ou a presença de outras substâncias podem representar para as fêmeas sinais de um ambiente inapropriado para o desenvolvimento de suas larvas”, diz à CH On-line um dos autores do artigo, Coby Schal, da Universidade do Estado da Carolina do Norte .
Segundo os pesquisadores, os compostos estimulantes alteram radicalmente o comportamento das fêmeas ao colocarem seus ovos. Normalmente, elas põem poucos ovos em um local e voam à procura de outro ambiente para deixar mais ovos. Ao entrar em contato com estimulantes, as fêmeas são levadas a liberar mais ovos e, conseqüentemente, passam mais tempo na superfície da água.
Com base nesse potencial, os estimulantes poderiam ser usados para aumentar o tempo de exposição dos mosquitos a armadilhas impregnadas com substâncias atrativas e com toxinas letais ou agentes biológicos (como patógenos ou reguladores de crescimento de insetos), que também seriam espalhados pelas próprias fêmeas para outros ambientes aquáticos. “Sem estimulantes para reter as fêmeas nas armadilhas, muitas colocariam seus ovos na água e escapariam”, argumenta Schal.
A equipe já está desenvolvendo uma armadilha com os estimulantes identificados e planeja realizar um amplo experimento de campo para documentar sua eficácia na redução das populações de mosquitos. Além disso, os cientistas buscam identificar outros compostos que estimulem o A. aegypti a colocar ovos.
Thaís Fernandes
Ciência Hoje On-line
07/07/2008