Armadilha jornalística?

Está certo, Cuba registrou, sim, a primeira vacina terapêutica contra o câncer de pulmão. Mas isso ocorreu em 2008 e não nesta semana, como publicaram alguns dos maiores e menores veículos de comunicação brasileiros. 

Páginas de notícias na internet e até emissoras de televisão divulgaram o feito da equipe liderada por Giselle Saurez Martinez como se fosse uma grande novidade. A maioria dos veículos citou o jornal cubano Trabajadores como origem da informação e chegou a usar as mesmas falas da cientista em seus textos. 

Tudo leva a crer que foi justamente uma reportagem recentemente publicada no jornal mencionado que levou os jornalistas a caírem na armadilha. 

No dia 8 de janeiro deste ano, o Trabajadores publicou uma matéria que comenta o sucesso da vacina em Cuba e sua possível aplicação no tratamento de outros tipos de câncer. A notícia deve ter sido mal interpretada e, talvez por isso, jornalistas começaram a espalhar que o jornal havia anunciado o registro da patente da vacina. O jornal anunciou, sim, esse registro, mas no dia 25 de junho de 2008!

notícia em Trabajadores
Reprodução da matéria publicada em 25 de janeiro de 2008, na página da internet do jornal cubado ´Trabajadores’, sobre a primeira vacina terapêutica contra o câncer de pulmão. Jornais brasileiros noticiaram o feito, em janeiro de 2011, como grande novidade.

Por meio de uma rápida pesquisa na internet, qualquer um pode encontrar o artigo científico relacionado ao estudo, publicado na última edição de 2009 do periódico Biotecnología Aplicada. O documento deixa claro que a vacina já está patenteada há algum tempo. 

Uma visita à página do Ministério da Saúde na internet revela, inclusive, que, graças a um acordo fechado com o Centro de Imunologia Molecular de Cuba em 2009, o Brasil tem permissão para realizar os testes necessários ao uso da vacina. Depois dessa etapa, geralmente demorada, é feito o pedido de registro na Anvisa para a sua comercialização no país.  

Já foi até realizado em Cuba, no ano passado, um simpósio internacional, com especialistas de todo o mundo, para discutir os principais resultados clínicos do uso da vacina no país. Diante de tantas evidências, é difícil entender o mal-entendido.

O episódio faz lembrar aquela velha e sábia expressão: não acredite em tudo o que você lê por aí.

 

Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line