Darwinismo carioca

 

No século 19, no bairro da Glória, no Rio de Janeiro, um ciclo de conferências para a disseminação das artes e da ciência trouxe à pauta popular um tema que já era alvo de polêmica na Europa e nas instituições letradas no Brasil: o darwinismo. Essas preleções não foram ignoradas pela imprensa, e os jornais cariocas tornaram-se veículo de repercussão e sedimentação das ideias nelas expostas.

É esse o tema do livro A tribuna da ciência: as Conferências Populares da Glória e as discussões do darwinismo na imprensa carioca (1873-1880), da historiadora paulista Karoline Carula. A partir de uma extensa pesquisa nos anais da imprensa do Rio de Janeiro do século 19, a autora busca mostrar de que forma esses veículos repercutiram as ideias – nem sempre alinhadas ao pensamento darwinista original – propagadas pelas conferências e sua importância na formação da opinião pública em relação ao conceito de raça.

Para exemplificar como o grande público assimilou a teoria darwinista, Carula fecha seu recorte histórico em 1880, ano de publicação do romance O Mulato, de Aluísio Azevedo. A boa recepção da obra pelas classes mais letradas foi um indício, para a autora, de que tanto as conferências da Glória quanto sua repercussão na imprensa ajudaram a preparar o público leitor para um romance de leitura darwinista.

Linguagem acadêmica
Por ser resultado da tese de mestrado de Carula, defendida na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o livro apresenta muitas características de um texto acadêmico. Nos três capítulos que o compõem, as extensas notas de rodapé, a padronização de referências a teóricos (com o uso de termos em latim como ibidem, que indica a repetição da referência anterior) e a própria linguagem da autora podem cansar o leitor desacostumado ou sem familiaridade com o tema.

Para aqueles, no entanto, que já possuem certo conhecimento sobre as teorias de Darwin ou têm um foco mais direcionado no assunto, A tribuna da ciência se coloca como leitura interessante, tanto por seu lado mais voltado para a história da imprensa quanto pelo viés sociológico da análise.

Mas, acima de tudo, o tema tratado por Carula é de interesse geral, porque pretende responder a uma pergunta importante para compreender a história do pensamento no Brasil: como o processo de racialização da humanidade – que começou a acontecer naquela época – se apoiou em ideias que buscavam mostrar justamente o oposto? Afinal, como afirma a também historiadora Iara Lis Schiavinatto na apresentação do livro, a teoria darwinista é uma “argumentação em favor de uma sociedade de iguais”.

A tribuna da ciência: as Conferências Populares da Glória e
as discussões do darwinismo na imprensa carioca (1873-1880)

Karoline Carula
São Paulo, 2009, Annablume Editora
185 páginas – R$ 31
Tel.: (11) 3031-1754  

Isabela Fraga
Especial para a CH On-line
05/08/2009