Não foi dessa vez que o ‘impossível’ aconteceu. Novos resultados apresentados pelo Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (Cern) bateram o martelo: nada mais de neutrinos viajando mais rápido do que a luz. A hipótese, que havia sido aventada em 2011 após experimentos do projeto Opera em parceria com grupos do próprio Cern, causou rebuliço por contrariar os princípios da relatividade especial de Einstein. Para físicos brasileiros e internacionais, o episódio marca uma vitória do rigor do método científico, uma constatação da eficiência dos processos de validação de resultados experimentais.
Anunciados na última sexta-feira (8/6), os resultados apresentam novos dados obtidos em quatro experimentos separados realizados por diferentes grupos de trabalho da instituição. Em todos, os neutrinos seguiram, obedientes, os princípios previstos na teoria da relatividade e não ultrapassaram a velocidade da luz.
As medições anormais do ano passado, que tornaram famosas essas pequenas partículas subatômicas quase sem massa e sem carga elétrica, foram atribuídas a equipamentos defeituosos. Essa possibilidade já havia sido levantada anteriormente para explicar as discrepâncias encontradas.
Ciência posta à prova
Sergio Bertolucci, diretor de pesquisa do Cern, afirmou durante uma conferência internacional sobre física e astrofísica de neutrinos, em Kyoto (Japão), onde os resultados foram apresentados, que embora não seja tão excitante quanto alguns gostariam, no fundo a conclusão era esperada. “O episódio serviu como uma oportunidade para o público perceber o método científico em ação, com um resultado inesperado colocado à prova e contestado pela colaboração de grupos que normalmente competem entre si. É assim que a ciência avança”, concluiu.
Para o físico brasileiro especialista em física de partículas André Massaferri, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), desde o início a comunidade científica adotou uma atitude acertada de ceticismo positivo em relação aos dados originais. “Foi, sem dúvida, uma vitória do rigor científico: todo resultado, antes de aceito, precisa ser amplamente comprovado e reproduzido”, destaca. “Esse ceticismo deve ser sempre proporcional à gravidade da observação e, nesse caso, a gravidade era enorme.”
Massaferri acredita que esse tipo de episódio, em que eventualmente se esbarra com conclusões pouco críveis, é comum em experimentos ‘de ponta’ – a experiência com os neutrinos era altamente complexa e exigia um rigor tecnológico desafiador. “É ótimo perceber que, embora tenha havido um erro, o próprio rigor científico permitiu que esse problema fosse identificado e os resultados descartados”, avalia.
O físico também comentou a grande repercussão do caso na mídia. Se, por um lado, representa uma evidente aproximação entre ciência e sociedade, por outro, o extremismo da situação também é significativo. “É de certa forma natural que o que desperte o interesse do público seja o caráter extraordinário ou assustador de um tema”, admite. “No limite, no entanto, o exagero pode aproximar a ciência do misticismo e estimular conexões muito pouco científicas”, alerta, fazendo questão de ressaltar a seriedade de todos os estudos relacionados aos neutrinos ‘velozes’.
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