Sensores de movimento já levaram inovação ao setor de transportes, segurança e entretenimento. Agora chegou a vez de a área médica se beneficiar com a tecnologia. A empresa holandesa Xsens, especializada em sistemas de captação e monitoramento de movimento em tempo real, propõe a aplicação de seus produtos em procedimentos ortopédicos e de reabilitação.
Uma possibilidade seria, por exemplo, o seu uso na recuperação motora de vítimas de acidente vascular cerebral (AVC). O paciente poderia utilizar, em casa, os sensores da Xsens para registrar seus avanços diários e transmitir os dados para seus médicos analisarem. Assim, não precisariam fazer tantas visitas aos centros de saúde.
Essa é justamente a ideia por trás da nova aplicação tecnológica: deslocar o tratamento do hospital para casa. “Além de representar uma necessidade diante das mudanças demográficas, os tratamentos domiciliares comandados pelos próprios pacientes apresentam uma série de vantagens”, afirma Erik Wilbrink, vice-presidente de vendas e marketing da Xsens.
“Eles são mais eficientes, mais bem adaptados às necessidades do usuário e mais interativos. Além disso, permitem ao paciente ter maior controle sobre a sua saúde e torna-o mais comprometido com os tratamentos.”
Assista ao vídeo produzido pelo governo holandês
sobre a tecnologia desenvolvida pela Xsens
Mais dinâmicos e precisos
A tecnologia atualmente utilizada em procedimentos ortopédicos e de reabilitação se baseia em medições pontuais feitas em hospitais ou laboratórios e em observações visuais que dependem estritamente da qualificação do operador.
Uma alternativa já disponível para a obtenção de dados mais objetivos e confiáveis é o uso de sistemas com câmeras, mas que ainda está longe de ser compatível com as exigências médicas atuais, como avaliações rápidas, pouco invasivas e acessíveis em termos econômicos.
O que a Xsens propõe é o uso de um sistema de captura e monitoramento de movimento baseado em sensores e capaz de oferecer dados precisos sobre parâmetros corporais do paciente, de forma contínua e em tempo real.
“O que distingue a Xsens de outras empresas do setor é a sua capacidade de criar sistemas de captura de movimento que podem ser utilizados em praticamente qualquer lugar, não restringem a locomoção e têm um bom custo-benefício”, afirma Pietro Garofalo, gerente de produtos da empresa.
O sistema mais recente desenvolvido pela Xsens, baseado em sensores inerciais, funciona totalmente sem fio. Esses sensores são distribuídos pelo corpo, criando uma rede de área corporal (BAN, na sigla em inglês de Body Area Network).
Cada um deles envia dados atualizados para a estação central – formada por um registrador de dados, um sincronizador e um recarregador –, que se conecta a um computador via USB.
Na estação, esses dados são fundidos com a ajuda de um algoritmo para o cálculo, em tempo real, da orientação espacial tridimensional verificada em cada ponto da rede. “A orientação é a medida fundamental utilizada pelos pesquisadores para a criação de protocolos clínicos baseados em análise de movimento”, explica Garofalo.
Por meio de um software de interface gráfica, o operador e o paciente podem visualizar as locomoções em 3D, no exato momento em que elas ocorrem.
Testada e aprovada
A tecnologia à base de sensores inerciais tem sido amplamente utilizada na pesquisa médica. Os resultados mais satisfatórios, segundo Garofalo, foram obtidos no Centro de Próteses INAIL, em Bolonha, na Itália. A instituição validou um protocolo clínico baseado no sistema da Xsens para a análise de pacientes com lesões nos ombros.
“O sistema validado permite monitorar o ombro assim como a ‘imagem radiográfica’ usada desde a década de 1940. A diferença é que, ao contrário da radiografia, um procedimento invasivo e caro, que precisa ser realizado em local e com pessoal especializados, ele pode ser empregado numa pequena sala de exame clínico, é rentável e de fácil interpretação”, diz Garofalo.
Outro hospital em Rimini, também na Itália, está adotando o mesmo protocolo para a avaliação pré e pós-operatória de pacientes com problemas no ombro. Nos Estados Unidos, a Universidade Loyola, em Chicago, pretende usar o sistema na avaliação pré e pós-treinamento de jogadores de beisebol ao longo da temporada de competições.
Já nos Países Baixos, berço da tecnologia, o Centro Médico VU, de Amsterdam, tem aplicado os produtos da Xsens em crianças com paralisia cerebral e artrose no joelho.
Um pouco de paciência
Apesar dos testes clínicos bem-sucedidos, o uso do sistema de captura de movimento por meio de sensores desenvolvido pela Xsens ainda não faz parte da rotina médica em hospitais e centros médicos.
Garofalo explica que a tecnologia é recente e, para ser implementada, ainda precisa passar pelo crivo da comunidade científica e médica. “Assim como em outras áreas da medicina, nos ramos da ortopedia e reabilitação, não basta apenas alta tecnologia”, ressalta.
“É preciso entender bem as necessidades dos usuários finais da tecnologia – no caso, os operadores e os pacientes – e encontrar a melhor forma de introduzir novos procedimentos em sua rotina.”
O uso clínico do sistema da Xsens depende também da criação de um protocolo clínico específico para orientar o seu uso. Portanto, ainda há um longo caminho entre os procedimentos hospitalares e a reabilitação em casa.
Carla Almeida*
Ciência Hoje On-line
* A jornalista viajou para os Países Baixos a convite do Ministério da Economia, Agricultura e Inovação do país.
No campo da ciência, além das possibilidades na ortopedia e reabilitação, pode ser aplicada em pesquisas biomecânicas, esportivas e ergonômicas.
Na indústria, as aplicações vão desde estimativas sobre a dinâmica de navios de carga usadas por instituição de pesquisa holandesa até o controle de aviões que funcionam sem piloto humano no Ártico.
Os sensores da Xsens também são empregados em treinamentos de diversos tipos, inclusive militar, junto com recursos de realidade aumentada. Essa técnica também pode ser usada como auxílio visual para fins médicos, em processos de montagem, projetos de engenharia e na indústria do entretenimento.
É nesse último setor que a Xsens vem ganhando mais visibilidade, especialmente em jogos e no cinema. A indústria cinematográfica de Hollywood recorreu recentemente à expertise da empresa na produção do filme Alice no país das maravilhas, de Tim Burton.
Instituições brasileiras também já demonstraram interesse pelos produtos da Xsens. A Universidade Estadual de Londrina, por exemplo, está testando o sistema de captura de movimento em procedimentos de reabilitação, enquanto o Instituto Nacional de Tecnologia adquiriu-o para fins ergonômicos.