Estação favela: batidão à margem da grande mídia

Todo fim de semana a cena se repete: um som carregado no baixo – o chamado batidão – reverbera nas caixas de som de clubes e quadras de escolas de samba localizadas em favelas e bairros pobres do Rio de Janeiro, contagiando uma massa negra a dançar e se esquecer das agruras cotidianas. Eis o funk carioca: ritmo que cresceu espontaneamente, sem dar a mínima para os mecanismos tradicionais da indústria cultural e à margem dos grandes veículos de comunicação.

Diversos acadêmicos já se debruçaram sobre o estudo do funk. Muitos são os motivos. Ele é a principal forma de lazer de milhares de jovens excluídos do Rio de Janeiro – maneira pela qual uma população desamparada de ações eficientes do Estado encontrou para se ressocializar. Além disso, representa mais um exemplo do tão falado antropofagismo cultural brasileiro: jovens que tomaram emprestado influências da música pop e criaram algo novo e popular.
 
Batidão: uma história do funk, do jornalista Silvio Essinger, traz mais um pouco de luz a esse fenômeno carioca, atendo-se mais a sua evolução musical e à história dos seus artistas. O livro retorna até a década de 1970, no começo dos bailes, época que o funk norte-americano influenciou uma série de DJs cariocas. Silvio cita reportagem do Jornal do Brasil de 1976, da jornalista Lena Frias, para explicar o fenômeno: “uma cidade de cultura própria desenvolve-se dentro do Rio”.
 
No início dos anos 1980, o funk carioca adota uma batida musical retirada de um outro estilo musical afro-americano, o hip-hop. A partir de então, o que vemos é um abrasileiramento cada vez maior do ritmo. Artistas da favela começam a cantar junto às bases criadas por DJ Marlboro, criando a figura do MC (Mestre de Cerimônias). As letras refletem todo o cotidiano de violência, desigualdade, sexo, romantismo e diversão dos jovens da periferia.
 
Silvio também conta a história feliz de artistas como Tati Quebra-Barraco, Bonde do Tigrão e  Latino, que alcançaram grande repercussão fora do universo do funk, e outras nem tanto, como de Suel, jovem MC morto com cinco tiros. Relata os períodos em que o funk se tornou modismo entre as elites e os momentos em que foi estigmatizado por causa das letras violentas ou dos bailes de corredor. Nesse momento, “a música era realmente o de menos – as galeras se encontravam mesmo para se estapear por seu território”.
 

Batidão: uma história do funk, tem um texto agradável, bem apurado e cheio de boas histórias. O livro não se propõe investigar os fatores sociológicos que possibilitaram o surgimento desse fenômeno, mas traça uma cuidadosa genealogia de alguns de seus principais protagonistas. Falta-lhe apenas um índice remissivo e mapas para auxiliar o leitor a se achar na explosiva e dançante arquitetura dos morros cariocas.

Batidão – uma história do funk
Silvio Essinger
Rio de Janeiro, 2005, Editora Record
Fone: (21) 2585-2000
292 páginas – R$ 42,90

Denis Weisz Kuck
Especial para a CH On-line
14/06/05