Mostrando a cara

Nas décadas de 1960 e 1970, os salões de arte universitária foram importante porta de entrada de jovens artistas no circuito profissional das artes plásticas no Brasil. Em Belo Horizonte, os salões e festivais promovidos pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) ajudaram a divulgar o trabalho de iniciantes que buscavam reconhecimento nacional e funcionaram como espaço de crítica ao circuito artístico tradicional do país.

Algumas décadas depois, a UFMG tenta reeditar o clima que revolucionou a cena artística local

Algumas décadas depois, a UFMG tenta reeditar esse clima que revolucionou a cena artística local, com o lançamento da Bienal Universitária de Arte. O evento, inaugurado em 2010, teve sua segunda edição em 2012, entre 8 de novembro e 2 de dezembro.

Dos quase 500 inscritos, foram selecionados 69 estudantes de 11 universidades brasileiras, da Argentina, Uruguai, Chile, Bélgica, Suécia e Áustria, que ocuparam galerias e espaços culturais com performances, instalações e mostras de pintura, desenho, gravura, escultura, fotografia e arte digital.

Para alcançar alunos de diferentes países, a UFMG e as instituições parceiras na realização da bienal (Universidade do Estado de Minas Gerais, Secretaria Estadual de Cultura e Fundação Cultural de Belo Horizonte) investiram na divulgação on-line do evento e distribuíram material impresso em escolas de belas artes de universidades brasileiras e latino-americanas.

“Nosso objetivo foi atrair estudantes de todas as partes, para estimular o diálogo sobre arte contemporânea entre jovens artistas”, disse o curador do evento, Fabrício Fernandino, da Escola de Belas Artes da UFMG.

Traços étnicos
Traços étnicos e flagrantes da vida em Cuba foram captados pelas lentes de Bruna Brandão e fazem parte do ensaio fotográfico apresentado na Bienal da UFMG. (foto: UFMG/ Divulgação)

Segundo o curador, os alunos de graduação têm acompanhado o diálogo que se firma cada vez mais entre a arte e outras áreas de estudo, a chamada transversalidade. “Por isso observamos forte influência da computação ou da ilustração científica, por exemplo, nos projetos artísticos dos estudantes.”

A bienal promoveu também a discussão de temas ligados à arte contemporânea em conferências e mesas-redondas. No V Fórum Arte das Américas, evento paralelo à bienal, a transversalidade na cultura contemporânea foi discutida pelo historiador e crítico mexicano Cauhutémoc Medina. Arte e ciência, transarquitetura, intermidialidade, e crítica e curadoria foram outras questões tratadas no fórum.

Arte coletiva

Um dos destaques da bienal é a chamada ‘residência artística’, que dá aos estudantes oportunidade de criar trabalhos compartilhados nos espaços de exposições. “As experiências que cada um traz de suas áreas de origem são muito positivas para o trabalho de criação coletiva”, observa Fernandino.

Um dos destaques da bienal é a chamada ‘residência artística’, que dá aos estudantes oportunidade de criar trabalhos compartilhados 

Durante dez dias, oito estudantes (quatro brasileiros e quatro estrangeiros) dividiram um alojamento para criar seus projetos em um ateliê aberto ao público, cedido pelo Espaço Cento&Quatro, no centro da capital mineira.

Segundo Fernandino, a proposta de um ateliê nesses moldes é única, já que a convivência entre os artistas e a opinião dos visitantes interferem na obra, dando origem a trabalhos às vezes muito diferentes do projeto original.

O residente Leonardo Gauna, da Universidad de La Plata, Argentina, utilizou as janelas do Espaço Cento&Quatro como suporte material para sua produção. Essa é uma estratégia do artista para vincular os desenhos ao seu entorno, fazendo com que eles interajam com o contexto urbano e social em que se inserem. O trabalho faz parte do projeto Ventanas, que o desenhista desenvolve desde 2011 em diferentes locais.

Paul Setúbal
Obra do brasileiro Paul Setúbal em acrílica e pigmento sobre papel. Para criar seus desenhos, o artista parte de imagens fotográficas de áreas urbanas. (foto: UFMG/ Divulgação)

Outro destaque da bienal da UFMG foram as homenagens ao pintor Alberto da Veiga Guignard, cujo cinquentenário de morte está sendo lembrado este ano. (Em cada uma das próximas edições, a bienal irá homenagear um artista de destaque no cenário brasileiro.)

Além de Guignard e sua obra terem sido tema da conferência de abertura do evento, feita pelo crítico José Augusto Ribeiro, o artista foi lembrado em uma mesa-redonda formada por alguns de seus ex-alunos. Durante a bienal, o público pôde visitar uma exposição com obras do “mestre da pintura brasileira”, como costuma ser carinhosamente chamado por seus muitos admiradores.

Mariana Ceccon
Especial para a Ciência Hoje On-line/ PR