O ciencês e as mil curas para o câncer

Há cada vez mais entre as pessoas um interesse pelas novidades cientificas. E o cidadão que emprega alguns minutos de seu tempo para ler uma notícia sobre pesquisas científicas ou para assistir a um noticiário sobre alguma descoberta da biologia, química ou física está interessado pelo que essas novidades possam representar para as suas vidas. É um interesse prático e legítimo, pois são os seus impostos que financiam grande parte das pesquisas – principalmente em nosso país.

Bem, aí é que mora o problema: a imensa maioria das descobertas científicas atuais é fruto de décadas de trabalho de vários laboratórios espalhados pelo mundo e os êxitos obtidos são resultado de acréscimos graduais obtidos aqui e ali. Isso é reflexo da complexidade atual das pesquisas. Por isso, é bastante difícil – e muitas vezes injusto – apontar alguém como responsável por uma descoberta de impacto.

Contudo, os divulgadores científicos – a maioria jornalistas em sua formação – têm a necessidade de apontar nomes (heróis e heroínas) que possam ser admirados e tidos como exemplo para o grande público. Aí se acabam cometendo injustiças e propagando inverdades.

Além disso, há outro grande obstáculo a ser superado: o cidadão que está lendo a notícia sobre alguma descoberta científica desconhece completamente os termos técnicos e tem compreensivelmente dificuldade em entender os impactos dessas descobertas sobre a sua vida.

Quantas vezes assistimos nos telejornais que a cura para o câncer foi obtida?

Para tentar superar esses problemas, muitos divulgadores apelam para simplificações e novamente para informações incorretas ou incompletas. Quantas vezes assistimos nos telejornais que a cura para o câncer foi obtida?

Do outro lado dessa questão estão alguns cientistas que se dedicam à divulgação. Muitos que o fazem incorrem em outro pecado: o excesso de termos técnicos e a propagação de um linguajar complexo e muitas vezes incompreensível para o grande público. É o tal do ciencês citado no título.

Grande parte desses problemas é reflexo de uma tendência infelizmente comum entre nossos pesquisadores: muitos escolhem o seu tema de estudo – uma molécula, uma via metabólica ou um organismo – sem ter em vista o que esse estudo pode representar para a vida dos cidadãos;  aqueles pagadores de impostos citados anteriormente.

Portanto, há necessidade de se ter divulgadores científicos capazes de escrever e falar sobre as descobertas cientificas de forma clara e compreensível – como fazem os jornalistas – e, ao mesmo tempo, que sejam capazes de mostrar o que esses avanços possam significar para o futuro da população – como fazem os bons cientistas.

Recém-chegado à Universidade Federal de Lavras (Ufla), estive conversando com o professor Renato Paiva, responsável pela editora dessa universidade. Durante a nossa conversa, o professor Paiva me contou que existem grandes pesquisadores na Ufla que não se interessam em divulgar o seu trabalho, apenas o fazendo por meio de publicações técnicas e científicas.

Essa tendência comum em todas as nossas universidades demonstra uma crença disseminada no mundo acadêmico. Quantas vezes já ouvi de meus orientadores que não era para “perder tempo” me dedicando à divulgação científica? Talvez eles tenham se esquecido de que quanto mais as suas pesquisas forem conhecidas, mais verbas eles terão para a sua manutenção… Afinal de contas, se até a Coca-Cola e a Microsoft fazem propaganda, por que nós não deveríamos fazer?

Somente quando tivermos profissionais capazes de divulgar de forma clara a ciência deixaremos de ver reportagens que são meras traduções de notícias publicadas em outros países. Além disso, poderemos estimar e valorizar o trabalho de nossos cientistas, tão pouco valorizados e conhecidos.

Esse é o desafio a que me propus há alguns anos: unir o mundo científico ao do jornalismo e mostrar para as pessoas a importância da ciência para as suas vidas. Nesse sentido, o blogue da CH é uma excelente iniciativa, pois permite a agilidade e interatividade próprias desse meio de comunicação.

Portanto, serão meus objetivos aqui na Conexão CH: tratar de forma clara e simples dos temas científicos que você ouvirá em seu dia a dia e, ao mesmo tempo, procurar ampliar um pouco mais o conteúdo tratado em minhas colunas. Obviamente, conto com a ajuda de todos vocês, leitores deste blogue, para me dedicar a esses desafios!

 

Jerry Carvalho Borges
Departamento de Medicina Veterinária
Universidade Federal de Lavras