Agora, um livro recém-lançado no Brasil traz a polêmica à tona mais uma vez: Norte verdadeiro , escrito por Bruce Anderson, resgata a história da descoberta do Pólo. O autor, repórter e ex-professor de jornalismo da Universidade da Carolina do Sul, resgata a disputa entre os exploradores em estilo leve e romanceado.
Apesar da rivalidade entre esses exploradores depois do episódio de 1909, o autor conta que eles foram grandes colaboradores em expedições anteriores ao Ártico. Peary (1856-1920) fez três tentativas de chegar ao Pólo: em 1891, em 1898 e em 1909. Cook (1865-1940) o acompanhou como médico da primeira expedição, em que conseguiu quebrar o recorde da maior latitude alcançada, que antes era do explorador norueguês Fridtjof Nansen.
Frederick Cook também participou de muitas expedições para explorar regiões desconhecidas antes de fazer sua única investida no Pólo, em 1908. Ele escalou o Monte McKinley, no Alasca, após duas tentativas (1903 e 1906) e viajou para a Antártica (1897-99) na Expedição Belga, a fim de estudar a geografia da região. É descrito como pesquisador dedicado e atento às soluções dos problemas que se apresentavam. Conseguiu uma forma de tirar o navio Bélgica do gelo após um ano de inverno antártico, salvando a tripulação de mais um ano de prisão na Antártica.
Anderson apresenta Robert Peary como uma pessoa interessada em fama e dinheiro. Ele defende a tese de que o explorador não tinha interesse científico no Pólo Norte e não fazia observações sobre geografia e até mesmo sobre a cultura dos esquimós, ao contrário de Cook, que, segundo o autor, se esforçou para documentar cada descoberta e traçar mapas dos lugares aonde ia.
Ruptura
Robert Peary (esq.) em foto de 1909, em sua última chance de conquistar o Pólo, e Frederick Cook (dir.), prestes a fazer a única investida no Pólo em 1907 (reprodução).
O primeiro rompimento entre os dois cientistas aconteceu, segundo o autor, quando Peary impediu Cook de publicar artigos acadêmicos sobre os esquimós – habitantes nativos do extremo norte. O primeiro não queria que nenhum integrante da viagem fizesse relatos antes que ele publicasse os próprios estudos. Devido a esse fato, o médico não aceitou participar da segunda expedição de Peary ao Pólo.
A grande briga, porém, foi em 1909, quando Cook alegou que tinha chegado ao Pólo Norte em 1908. Peary interpretou a própria tentativa do antigo colaborador como uma traição que visava impedi-lo de vencer a “disputa” de chegada ao Círculo Polar Ártico. Por isso fez tudo o que pôde para prejudicar o outro explorador: apropriou-se de seus bens no Ártico para embarcar um de seus colaboradores em seu navio e impediu que os registros e instrumentos de Cook embarcassem para os Estados Unidos – o que resultou na perda definitiva das provas de que o médico teria chegado ao Pólo –, além de ter comprado depoimentos de antigos colaboradores do explorador a fim de desacreditar a escalada do Monte McKinley e de acabar com a reputação científica do rival.
No livro fica claro que o autor acredita na tese de Cook, mas na historiografia oficial a dúvida persiste. Até a década de 1980, o relato de Peary era considerado verdadeiro pela maioria dos pesquisadores. Porém, a incerteza reapareceu após a publicação de uma reportagem da National Geographic em 1988. Depois de ter acesso aos registros de Peary, os estudiosos concluíram que ele esteve a 128 quilômetros do Pólo. Até hoje não há um consenso entre os historiadores sobre a questão.
Bruce Anderson descreve os fatos e as impressões pessoais dos exploradores como se tivesse assistido a tudo e soubesse o que se passava na cabeça deles. Ele usa muitas técnicas da narrativa ficcional, como o recurso ao suspense e a descrição psicológica dos personagens. A riqueza de detalhes sobre a vida dos exploradores dá vida à narrativa, que lembra mais uma biografia do que um relato histórico.
Norte verdadeiro – Peary, Cook e a corrida ao Pólo
Bruce Henderson (tradução: Marta Miranda O’Shea)
Rio de Janeiro, 2006, Editora Objetiva
Fone: (21) 2199-7824
365 Páginas – R$ 49,90
Franciane Lovati
Ciência Hoje On-line
06/04/2006