Boa notícia para o sertão

Não há dúvidas da ligação da água com a vida: sem a primeira não há a segunda. Em se tratando de um país com 12% da água doce do mundo inteiro, o Brasil poderia ficar despreocupado, mas quem vive nas regiões de seca sabe que não é bem assim. O índice médio de chuvas no sertão nordestino não passa dos 800 milímetros por mês, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), enquanto a capital do país, Brasília, marca em média 1.500 milímetros mensais.

A cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte, não registra mais do que 195 milímetros no mês de maior quantidade de chuva. Mas, se falta água, brotam ideias. Na região surgiu uma solução para diminuir os impactos da seca na agricultura. O projeto, desenvolvido pelo agrônomo José Leôncio de Almeida Silva, da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa), ficou em primeiro lugar na categoria Ensino Superior do Prêmio Jovem Cientista deste ano, que teve como tema ‘Água: desafios da sociedade’ e foi anunciado na semana passada.

O uso da água do aquífero permitirá o desenvolvimento da atividade agrícola o ano inteiro, evitando as migrações das famílias na época da estiagem

“A ideia surgiu como forma de aproveitar a água salina, imprópria para consumo, e melhorar a vida aqui na região semiárida”, conta Silva. Por isso, ele propôs misturar a água do aquífero calcário Jandaíra, que tem alta concentração de sal, com água de torneira para uso na irrigação. A salinidade da água do aquífero está em torno de 5 ppts (partes por mil, na sigla em inglês), índice acima do recomendado para uso na agricultura, que é de 2 ppts. Concentrações superiores a 0,5 ppt já tornam a água imprópria para consumo humano.

O método de produção da mistura é bastante simples. “Primeiro verifico a salinidade da água para definir o volume necessário de água da torneira, que serviria como um solvente para o sal”, diz Silva.

A mistura foi aplicada no solo para produção de milho e sorgo em Mossoró e, após 50 dias de acompanhamento, houve resultados promissores. “O solo se manteve fértil e as lavouras não perderam concentração de proteínas, apesar de as folhas terem ficado menores”, avalia o pesquisador.

O uso da água do aquífero permitirá o desenvolvimento da atividade agrícola o ano inteiro, evitando as migrações das famílias na época da estiagem.

Mais prêmios

Além de José Leôncio de Almeida Silva, o estudante de ensino médio Edivan Nascimento Pereira e o mestre em engenharia de energia Gustavo Meirelles Lima venceram em suas respectivas categorias o Prêmio Jovem Cientista de 2013.

Vencedores do Prêmio Jovem Cientista 2013
Os vencedores do Prêmio Jovem Cientista deste ano desenvolveram técnicas para o tratamento e aproveitamento da água. Da esquerda para a direita: Gustavo Lima, José Leôncio Silva e Edivan Pereira. (foto: Rúbio Guimarães)

Pereira fez sua pesquisa pensando em melhorar o acesso à água de qualidade no local onde reside, em Moju, no Pará. Por viver períodos de seca, não há na comunidade a preocupação de tratar a pouca quantidade de água disponível para consumo. Considerando que o Pará é grande produtor de açaí, com 200 mil toneladas por mês, o estudante de 19 anos desenvolveu uma técnica de filtração da água usando o caroço desse fruto.

O estudante desenvolveu uma técnica de filtração da água usando caroço de açaí

No laboratório da sua escola, ele mergulhou o caroço em uma solução de hidróxido de sódio e o decompôs em uma câmara à altíssima temperatura de 400°C para ativar o carvão existente na semente. Colocado dentro de um filtro comum, o material purifica a água e ainda garante um destino sustentável para os resíduos da produção de açaí.

Já o vencedor da categoria Mestre e Doutor, da Universidade Federal de Itajubá, em Minas Gerais, percebeu que a pressão feita pela água nas redes de abastecimento pode gerar pequenas quantidades de energia. Lima desenvolveu um sistema capaz de aproveitar essa energia potencial no próprio processo de produção e distribuição de água, diminuindo seus custos. Além disso, a metodologia permite controlar a pressão da água nas tubulações, reduzindo o número de vazamentos.

Os trabalhos inscritos no Prêmio Jovem Cientista deste ano refletem uma preocupação mundial com a conservação e o uso eficiente da água, recurso que está cada vez mais ameaçado. Os vencedores receberão os prêmios em dezembro no Palácio do Planalto. Os primeiros lugares de cada categoria também participarão da Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência em 2014.

Camille Dornelles
Ciência Hoje On-line