Brasileiros obtêm pele humana em laboratório

Pela primeira vez no Brasil, cientistas conseguiram reconstruir em laboratório a pele humana. A descoberta pode curar lesões dermatológicas como queimaduras graves e ferimentos profundos, além de ser útil às indústrias farmacêutica e de cosméticos. Contudo, a técnica desenvolvida na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), apesar de revolucionária, não tem como ser testada em larga escala devido à falta de recursos.

O procedimento de reprodução da pele inicia-se com a retirada de um pequeno pedaço (1 x 2 cm) de pele sadia do próprio paciente. Dessa fração são extraídos os três principais tipos de células epiteliais (fibroblastos, melanócitos e queratinócitos). Tais células são cultivadas separadamente em meios específicos, para depois serem novamente unidas, formando círculos de pele com cinco centímetros de diâmetro.
 
Os novos trechos de pele são então aplicados nas lesões, como ponto de partida para o processo de regeneração natural do organismo. Dependendo da área dos ferimentos, são cerca de 45 dias até sua cura, ou seja, até que os enxertos estejam totalmente aderidos à pele do resto do corpo. Essa técnica elimina os riscos de rejeição ao órgão, já que o paciente é seu próprio doador. “A nova pele não é um produto artificial, mas sim um tratamento individual”, esclarece a dermatologista Beatriz Puzzi, coordenadora dos estudos.
 
Ainda assim, a nova pele também poderia despertar o interesse das indústrias farmacêutica e de cosméticos, pois seria possível testar medicamentos e cosméticos na pele reconstruída in vitro , em vez de fazer experimentos com os produtos em humanos ou animais.

Entretanto, o método desenvolvido no Laboratório de Cultura de Células da Pele da Unicamp não é tão simples como uma colagem de células. Até os resultados recentes, foram mais de cinco anos de pesquisas. Inicialmente, a equipe cultivou apenas as células de pigmentação da pele, os melanócitos, em busca de um tratamento para o vitiligo. Bem sucedido, esse trabalho impulsionou a cultura dos outros dois tipos de células usados no procedimento atual: os queratinócitos e os fibroblastos.
 
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As fotos mostram culturas dos três tipos de células da pele que o método desenvolvido na Unicamp permite reproduzir – da esquerda para a direita: fibroblastos, queratinócitos e melanócitos.

Pertencentes à camada mais interna da pele (derme), os fibroblastos são responsáveis pela produção de fibras de colágeno, que dão sustentação ao órgão. Extraídos da amostra saudável da pele do indivíduo, eles são cultivados e posteriormente depositados em colágeno bovino estéril, que serve para nutri-los inicialmente e direcionar seu crescimento (posteriormente, essa substância é substituída por colágeno humano, produzido naturalmente pelos próprios fibroblastos conforme se multiplicam). Já os queratinócitos são encarregados da proteção da pele. Assim como os melanócitos, são retirados da camada mais externa da pele (epiderme) e cultivados em um meio específico, composto por aminoácidos.

Segundo Puzzi, os meios de cultura representam os elementos mais custosos do tratamento com a pele reproduzida em laboratório. Para cada litro dessas substâncias, são necessários, em média, R$ 1.400,00.  “Por isso, não houve condições de aplicá-lo em pacientes como vítimas de queimaduras que afetam uma área muito grande do corpo e acidentados que têm feridas profundas, ou em quem sofre de vitiligo”, lamenta a médica.


Lia Brum

Ciência Hoje On-line
11/07/05

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