Bulbo olfatório tem novos neurônios

O bulbo olfatório, realçado em vermelho no desenho de 1543 do anatomista belga Andreas Vesalius (1514-1564).

O nascimento de novos neurônios acaba de ser registrado em mais uma região do cérebro humano adulto. Uma equipe de cientistas da Suécia e da Nova Zelândia mostrou que essas células são formadas no bulbo olfatório, envolvido na percepção de odores. Ainda que esse já fosse um resultado esperado, a descoberta reforça a idéia de que a neurogênese em humanos não se limita à infância, ao contrário do que se acreditou por muito tempo.

Em estudo publicado esta semana na revista Science , a equipe de Peter Eriksson, da Universidade de Gotemburgo (Suécia), demonstra a existência, no cérebro humano, de uma corrente migratória que leva células nascidas na região subventricular do cérebro ao bulbo olfatório, onde algumas delas se transformam em neurônios maduros.

Essa corrente já havia sido identificada no cérebro de roedores, mas assume uma configuração espacial diferente no cérebro humano, em função do grande tamanho do córtex. Para identificá-la, o grupo recorreu a diversas técnicas, como o imageamento por ressonância magnética, a microscopia eletrônica e o uso de marcadores químicos.

“O sistema olfatório evoluiu como um mecanismo importante para a sobrevivência ao detectar sinais de perigo como fumaça ou alimentos contaminados”, explicam os autores no artigo. “A adição de novos neurônios no bulbo olfatório humano na idade adulta pode contribuir para a plasticidade nesse sistema.”

A descoberta não chega a surpreender, no entanto. “Esse resultado já era esperado, porque essa corrente migratória de novos neurônios tem sido demonstrada em várias espécies de animais”, afirma o neurocientista Roberto Lent, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e colunista da CH On-line . “A novidade foi tê-lo feito em humanos.”

Caso encerrado

A foto mostra um novo neurônio formado no bulbo olfatório, realçado por dois marcadores químicos: um, em vermelho, destaca o núcleo de neurônios; o outro, em verde, permite identificar divisões celulares e a formação de novas células (foto: Science ).

A descoberta ajuda a enterrar o dogma de que, no cérebro humano, os neurônios seriam formados apenas durante a infância. Essa idéia vem sendo derrubada nos últimos anos: após a descoberta de que novos neurônios são criados no cérebro adulto de algumas espécies de aves e primatas, o fenômeno foi finalmente identificado no cérebro humano em 1998. Nesse ano, uma equipe – que contava com a participação de Peter Eriksson – identificou o nascimento de novos neurônios no giro dentado do hipocampo, região cerebral envolvida no armazenamento da memória.

No entanto, a formação de novos neurônios nunca foi identificada no córtex adulto – região responsável por algumas das funções mais “nobres” do cérebro humano, como o discurso e o pensamento articulado. Ao contrário, um trabalho publicado no ano passado, por uma equipe que incluía Eriksson e outros autores do estudo publicado esta semana na Science , mostrou que novos neurônios não são formados no córtex adulto.

Essa descoberta não representa necessariamente uma desvantagem, na avaliação de Roberto Lent. “É vantajoso possuir um plantel fixo de neurônios, sobre os quais construímos nossa biografia”, concluiu ele na coluna em que discutiu a neurogênese no córtex adulto. “Afinal, parte importante do monumental arquivo de informações alojadas em nossa memória tem que ser definitiva, para que não nos esqueçamos nunca do vocabulário que aprendemos na infância, das pessoas que passaram pela nossa vida e da nossa própria história.” 

Bernardo Esteves
Ciência Hoje On-line
15/02/2007