Caçador de planetas

Nos últimos 25 anos, mais de mil planetas foram descobertos fora de nosso Sistema Solar. Alguns desses exoplanetas são rochosos como a Terra, mas nenhum se parece com ela a ponto de ser habitável. Uma missão da Agência Espacial Europeia (ESA) em parceira com pesquisadores de vários países, inclusive do Brasil, pode mudar esse panorama em um futuro não tão distante com o lançamento de um supertelescópio espacial que promete vasculhar mais de um milhão de estrelas em busca de planetas gêmeos da Terra.

Chamado de Plato (do inglês, Planetary Transits and Oscillations of Stars), o equipamento, ainda no papel, é, na verdade, um satélite com 34 telescópios e 136 câmeras acopladas que permitirão ver em detalhes os menores e mais distantes exoplanetas. A missão, estimada em um bilhão de euros, foi aprovada este mês pela ESA e o lançamento do satélite está previsto para 2024, quando será levado pela nave russa Soyuz até uma órbita entre o Sol e a Terra.

O equipamento, ainda no papel, é um satélite com 34 telescópios e 136 câmeras acopladas que permitirão ver em detalhes os menores e mais distantes exoplanetas

O supertelescópio terá a capacidade de medir os tamanhos, as massas e, por consequência, as idades dos planetas e sóis que encontrar. Com essas informações, os cientistas poderão saber se esses sistemas solares são parecidos com o nosso e, portanto, poderiam abrigar vida.

“O Plato vai iniciar um novo capítulo na exploração dos exoplanetas”, diz a astrônoma líder da missão, Heike Rauer, do Centro Aeroespacial Alemão (DLR). “Esperamos encontrar planetas que orbitem a chamada ‘zona habitável’ de suas estrelas.”

A zona habitável a que se refere a cientista é qualquer região em que um planeta consiga manter água líquida em sua superfície, requisito indispensável para a existência de vida. No caso de nosso Sistema Solar, a Terra está nessa zona privilegiada. Em outro sistema, essa zona poderia ser mais próxima ou mais distante do sol, dependendo do tamanho e da idade da estrela e das características do planeta.

Na procura por planetas nessas condições, os cientistas vão usar dados preciosos obtidos pelo Plato, como a medição da luz das estrelas. Uma das técnicas que serão usadas para encontrar esses planetas é observar se uma determinada estrela tem sua luz interrompida, o que indicaria a passagem de um planeta em frente a ela.

É a luz das estrelas também que permitirá saber a massa, o tamanho e a idade dos astros analisados. “As oscilações estelares são uma espécie de digital da relação da massa da estrela com seu raio e essas duas grandezas são exatamente os parâmetros que nos permitem ver a evolução temporal da estrela e, logo, a sua idade”, explica o físico da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) José do Nascimento Jr., um dos cinco brasileiros envolvidos na missão, alocados na Universidade de São Paulo (USP), na Universidade Mackenzie (SP) e no Instituto de Tecnologia Mauna (Havaí).

Atualmente, esse tipo de medição só pode ser feito pelos telescópios espaciais Kepler e Corot, mas não com a precisão que o Plato oferecerá.

Participação brasileira

Depois de lançado, o telescópio passará três anos coletando dados até que a análise da informação comece. Quando essa etapa chegar, os cientistas brasileiros envolvidos no projeto, que já participam ativamente da preparação da missão, terão que arregaçar ainda mais as mangas.

O trabalho brasileiro será direcionado para a identificação de estrelas semelhantes ao nosso Sol que possam servir de base do sistema solar de um planeta habitável. “Iremos explorar a física relacionada com a atividade magnética das gêmeas e análogas solares, bem como sua evolução temporal”, conta Nascimento Jr.

Exoplanetas
Já são conhecidos mais de mil planetas fora de nosso Sistema Solar, mas nenhum deles parece ser habitável. (foto: ESA/ C. Carreau)

Os brasileiros já têm ampla experiência no estudo dessas estrelas. A primeira gêmea solar observada, a 18 Scorpii, foi identificada por um cientista daqui, o astrônomo Gustavo Mello, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1997. De lá para cá, pesquisadores de instituições nacionais identificaram cinco das cerca de 20 estrelas desse gênero conhecidas, entre as mais recentes, a HIP 102152.

Planeta solitário?

Em última instância, o que a missão Plato procura responder é se estamos sozinhos no universo como único planeta habitado ou não.

Em última instância, o que a missão Plato procura responder é se estamos sozinhos no universo como único planeta habitado ou não

Os dados do satélite servirão para uma espécie de triagem de potenciais sistemas solares habitáveis que poderão ser mais bem analisados com telescópios hoje ainda em construção, como o ELT (Extremely Large Telescope). Esse equipamento será capaz de determinar a composição da atmosfera de um exoplaneta e ajudar os cientistas a ter mais clareza sobre a presença de vida.

“Plato está em perfeita sinergia com os supertelescópios que vêm sendo construídos recentemente; com eles poderemos encontrar novos planetas Terra e, possivelmente, vida, para enfim responder a indagação de como evoluímos e como permanecemos aqui neste planeta azul em torno desta estrela chamada Sol”, comenta Nascimento Jr. E completa: “Seria o Sistema Solar uma raridade na galáxia?”

Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line