Cientistas estudam sobreviventes da extinção dos dinossauros

Duas espécies raras de mamíferos do gênero Solenodon podem ter sobrevivido à suposta queda de um asteróide que teria eliminado os dinossauros da Terra. Esses mamíferos já habitavam o planeta há 76 milhões de anos, no período Cretáceo, cerca de 10 milhões de anos antes da época em que se estima que os grandes vertebrados tenham sido dizimados. Essa é uma das conclusões do estudo feito por uma equipe do Instituto Nacional do Câncer (NCI) dos Estados Unidos, com a colaboração de um biólogo brasileiro.

A espécie S. paradoxus , nativa da ilha de Hispaniola, no Caribe, teria sobrevivido à extinção que dizimou os dinossauros (reprodução / Universidade de Maryland)

As duas espécies em questão têm aparência similar à dos gambás e ocorrem em ilhas do Caribe. Os animais têm hábitos primitivos, são cavadores e habitam florestas em buracos e tocas, característica que poderia explicar a possível sobrevivência à queda do asteróide. Eles são pequenos, marrons acinzentados, com unhas e focinho comprido. Têm olhos pequenos e se alimentam de insetos e outros invertebrados de solo.

A descoberta foi feita em um projeto que, há seis anos, analisa o seqüenciamento do genoma de mamíferos placentários para determinar suas linhagens. Em 2003, os cientistas começaram a avaliar duas espécies caribenhas: a Solenodon cubanus , de Cuba e a S. paradoxus , da ilha de Hispaniola.

“Como a espécie cubana já foi considerada extinta e não há exemplares em cativeiro, tivemos que usar o material genético de espécimes de museus dos EUA e da Alemanha”, explica o brasileiro Eduardo Eizirik, pesquisador do Centro de Biologia Genômica e Molecular da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. “A espécie de Hispaniola é mais comum e sua amostra de sangue foi emprestada por um zoológico da República Dominicana.”

Eizirik é um dos oito autores do artigo que relata a descoberta, publicado em 10 de junho na revista Nature. Sua participação no estudo se deu durante seu pós-doutorado no Laboratório de Diversidade Genômica do NCI.

O biólogo explica que não havia evidências de que algum grupo de animais da região, onde teria ocorrido o impacto do asteróide, tivesse sobrevivido à catástrofe. No entanto, a pesquisa revelou que esses mamíferos podem estar naquela área desde a época que as ilhas em que vivem ainda eram conectadas ao continente.

“O fato é compatível com outra hipótese nossa: embora sejam do mesmo gênero, as duas espécies são bem distintas e têm surgimento separado por 25 milhões de anos”, diz. “Provavelmente a dispersão desse gênero de insetívoros ocorreu pela separação de placas tectônicas que deu origem às ilhas do Caribe, o que chamamos de processo de vicariância.”

Atualmente esses mamíferos estão ameaçados pela devastação local das florestas e pela atividade humana, que causa impacto negativo de predação por cães e gatos. Eizirik enfatiza a necessidade de medidas enérgicas de preservação para evitar a extinção desses animais que correspondem a toda uma ordem. “Como eles não mudaram muito ao longo de milhões de anos, podem nos ajudar a entender vários aspectos da evolução e morfologia de mamíferos e explicar muitos eventos sobre a vida passada na Terra.”

Renata Moehlecke
Ciência Hoje On-line
13/07/04